terça-feira, 14 de maio de 2019

Via Láctea sofreu surto de formação estelar há 2 a 3 bilhões de anos

Uma equipe liderada por pesquisadores do Instituto de Ciências do Cosmos da Universidade de Barcelona (ICCUB) e do Observatório Astronômico de Besançon (França) descobriu, através da análise de dados do satélite Gaia, que ocorreu, há 2 a 3 bilhões de anos, um surto extremo de formação estelar na Via Láctea.


© Gaia/R. Mor (distribuição de estrelas num esquema dos braços espirais da Via Láctea)

Distribuição das 3 milhões de estrelas usadas neste estudo para detectar o surto de formação estelar. O Gaia forneceu a distância de cada um destes objetos no disco galáctico. A distribuição está sobreposta a um esquema dos braços espirais da Via Láctea.

Neste processo podem ter nascido mais de 50% das estrelas que criaram o disco galáctico. Os resultados são derivados da combinação das distâncias, cores e magnitudes das estrelas medidas pelo Gaia com modelos que preveem a sua distribuição na nossa Galáxia.

Assim como uma chama se apaga quando não há gás no isqueiro, o ritmo da formação estelar na Via Láctea, alimentado pelo gás aí depositado, deveria ter diminuído lentamente e de forma contínua até esgotar o gás existente. Os resultados do estudo mostram que, embora este processo tenha ocorrido ao longo dos primeiros 4 bilhões de anos da formação do disco, uma explosão de formação estelar inverteu esta tendência. A fusão com uma galáxia satélite da Via Láctea, rica em gás, pode ter fornecido novo combustível e reativado o processo de formação estelar, de forma semelhante a abastecer o isqueiro. Este mecanismo explicaria a distribuição das distâncias, idades e massas estimadas a partir dos dados obtidos pelo satélite Gaia da ESA.

"A escala de tempo deste forte surto de formação estelar, juntamente com a grande quantidade de massa estelar envolvida no processo, bilhões de massas solares, sugere que o disco da nossa Galáxia não teve uma evolução estável e pausada, mas que pode ter sofrido um grande distúrbio externo que começou há cerca de 5 bilhões de anos," disse Roger Mor, pesquisador do Instituto.

Os modelos cosmológicos preveem que a nossa Galáxia teria crescido devido à fusão com outras galáxias, fato demonstrado por outros estudos que usam dados do Gaia. Uma destas fusões pode ser a causa do surto severo de formação estelar detectado neste estudo. "Na verdade, o pico de formação estelar é tão evidente, ao contrário do que previmos antes de termos dados do Gaia, que achamos necessário abordar a sua interpretação juntamente com especialistas em evolução cosmológica de galáxias externas," explica Francesca Figuerars, professora do Departamento de Física Quântica e Astrofísica da Universidade de Barcelona, membro do ICUUB.

"Os resultados obtidos correspondem aos que os modelos cosmológicos atuais preveem e, além disso, a nossa Galáxia, aos olhos do Gaia, é um laboratório cosmológico excelente onde podemos testar e comparar modelos do Universo a uma muito maior escala," disse o especialista em simulações de galáxias parecidas à Via Láctea, Santi Roca-Fàbrega, da Universidade Complutense de Madrid.

Este estudo foi realizado com a segunda divulgação de dados da missão Gaia, publicada há um ano, no dia 25 de abril de 2018.

Em apenas um ano, mais de 1.200 artigos revistos por pares publicados em revistas científicas, mostram o antes e o depois do Gaia em praticamente todos os campos da astrofísica, desde a recente detecção de novos aglomerados estelares, novos asteroides, até à confirmação das origens extragalácticas para estrelas na Via Láctea, passando pelo cálculo da massa da Via Láctea e pelas descobertas que mostram que remanescentes estelares, chamados anãs brancas, acabam por solidificar-se lentamente.

O satélite Gaia continua operarando normalmente e próximo mês de julho os cinco meses nominais de operação científica chegarão ao fim, mas a ESA aprovou o prolongamento da missão até ao final de 2020 e estima-se que exista combustível suficiente no satélite para continuar operando até 2024.

O estudo foi aceito para publicação na revista Astronomy & Astrophysics.

Fonte: Universitat de Barcelona

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