sexta-feira, 29 de junho de 2018

Decifrada a Pedra de Roseta dos núcleos galácticos ativos

Uma galáxia com pelo menos um buraco negro supermassivo ativo, denominada OJ 287, tem provocado muitas irritações e questões no passado.

© MPIA/Axel M. Quetz (ilustração da região central da galáxia ativa OJ 287 com um jato precessor)

A imagem acima mostra que a precessão pode ou ser provocada por um buraco negro binário ou por um disco de acreção desalinhado.

A radiação emitida por este objeto abrange uma ampla faixa, desde o rádio até às energias mais altas no regime TeV. A potencial periodicidade desta emissão óptica variável fez desta galáxia uma candidata a hospedar um buraco negro binário supermassivo no seu centro. O objeto foi assim rotulado como a "Pedra de Roseta" dos núcleos galácticos ativos, expressando a esperança de que pudesse ser um objeto prototípico e, uma vez decifrado, pudesse explicar as propriedades fundamentais dos buracos negros ativos em geral.

Agora, uma equipe internacional de astrônomos liderada por pesquisadores do Instituto Max Planck descobriu que o núcleo galáctico ativo de OJ 287 gera um jato ligeiramente precessor numa escala de tempo de aproximadamente 22 anos. A precessão observada do jato também poderá explicar a variabilidade na radiação da galáxia. Esta detecção resolve muitos enigmas de uma só vez e fornece uma chave para entender a variabilidade nos núcleos galácticos ativos.

Levamos muito tempo para decifrar os hieróglifos egípcios, as inscrições das pirâmides. Finalmente conseguimos com a ajuda da denominada Pedra de Roseta, encontrada em 1799. Esta estela foi inscrita com três versões do mesmo texto: uma em Egípcio Antigo usando hieróglifos, uma em escrita Demótica e a inferior em Grego Antigo. Percebendo que é o mesmo texto, os enigmáticos hieróglifos puderam ser decifrados e traduzidos com a ajuda da antiga língua grega. Esta descoberta abriu uma nova janela para entender a antiga cultura egípcia. Uma equipe de pesquisa decifrou agora o jato de uma galáxia que foi apelidada de Pedra de Roseta dos blazares. Os blazares são núcleos galácticos ativos onde um buraco negro supermassivo central está sendo alimentado.

A bem conhecida galáxia OJ 287, a uma distância de aproximadamente 3,5 bilhões de anos-luz, hospeda pelo menos um buraco negro supermassivo com a massa de milhões ou bilhões de sóis. O buraco negro supermassivo está ativo e produz um jato, uma corrente de plasma originária da região nuclear central na vizinhança do buraco negro. Este jato é observável no rádio. A galáxia é também um alvo na região do visível. As flutuações do brilho desta galáxia, no visível, são lendárias e têm sido observadas desde o final do século XIX, fornecendo uma das mais extensas curvas de luz da Astronomia.

No entanto, apesar de décadas de observações em rádio de muitas fontes de jatos e de muitos estudos sofisticados, os jatos permaneciam enigmáticos. Tradicionalmente, a origem das variações do brilho do jato, observadas no rádio, era atribuída ao mecanismo de alimentação do jato pelo sistema do buraco negro central. Por outro lado, as características móveis observadas nos jatos, chamadas nós, eram atribuídas a choques que viajam pelo jato. Os cientistas procuraram uma ligação entre os dois fenômenos, mas isso não podia ser feito de forma consistente até agora.

A equipe de pesquisa, liderada por Silke Britzen do Instituto Max Planck para Radioastronomia em Bonn, Alemanha, usou uma técnica de observação a fim de monitorar em detalhe o jato da OJ 287 perto do seu local de lançamento no buraco negro central. A técnica de radiointerferometria envolve radiotelescópios espalhados pelo globo com o objetivo de construir um monstruoso telescópio virtual com o diâmetro da Terra, capaz de observar detalhadamente os centros das galáxias e de observar jatos próximos do buraco negro central.

Considerando um grande conjunto de dados que abrangem um longo período de tempo, foi encontrado agora uma forte indicação de que ambos os fenômenos têm a mesma origem: ambos os tipos de observações podem ser explicados somente pelo movimento do jato. O jato, propriamente dito, está em precessão. Michal Zajacek, também do Instituto, responsável pela modelagem da precessão, afirma: "As variações de brilho resultam da precessão que induz uma variação do aumento Doppler quando o ângulo de visão do jato muda. Foi realmente surpreendente quando descobrimos que não só o jato tem precessão, como parece também seguir um movimento menor semelhante a uma nutação. O movimento combinado de precessão-nutação leva à variabilidade no rádio e também pode explicar algumas das erupções de luz."

Britzen e a sua equipe estão convencidos de que o cenário de precessão também pode explicar os 130 anos de erupções ópticas desta fonte mas, como sempre, são necessários mais dados e mais trabalho para uma confirmação final.

Permanece uma questão premente sobre a origem da precessão do jato. A precessão é um processo físico bem conhecido dos piões ou até da própria Terra. O eixo de rotação do nosso planeta não é estável, mas orbita no espaço com um período de 26.000 anos devido à influência gravitacional do Sol e da Lua. Para a precessão do jato na OJ 287, a equipe indicou dois cenários possíveis. "Ou temos um sistema com dois buracos negros supermassivos, com o disco que expele o jato forçado a oscilar devido aos efeitos de maré do buraco negro secundário, ou um único buraco negro que interage com um disco de acreção desalinhado," conclui Christian Fendt do Instituto Max Planck para Astronomia em Heidelberg.

De qualquer das maneiras, o jato da galáxia ativa OJ287 é um dos mais bem compreendidos até agora e certamente será usado para também decifrar outros jatos extragaláticos. Poderá até ajudar a desvendar ainda mais a atividade enigmática dos buracos negros supermassivos.

Os resultados foram publicados na revista científica Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte: Royal Astronomical Society

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