sexta-feira, 29 de novembro de 2024

Um "Netuno quente" numa órbita íntima

Um planeta do tamanho de Netuno, TOI-3261 b, tem uma órbita muito próxima da sua estrela hospedeira.

© JPL-Caltech (ilustração de um Netuno quente)

Apenas o quarto objeto deste tipo alguma vez encontrado, poderá revelar pistas sobre a forma como planetas como este se formam. 

Uma equipe internacional de cientistas utilizou o telescópio espacial TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) da NASA para descobrir o exoplaneta TOI-3261 b, tendo depois efetuado observações adicionais com telescópios terrestres na Austrália, Chile e África do Sul. 

O novo planeta está inserido numa categoria com tão poucos membros. Esta variedade de exoplanetas é semelhante ao planeta Netuno em tamanho e composição, mas orbitam extremamente perto da sua estrela. Neste caso, um "ano" em TOI-3261 b tem apenas 21 horas de duração. Uma órbita tão íntima faz com que este planeta pertença a um grupo exclusivo com, até agora, apenas três outros membros: Netunos quentes de período ultracurto cujas massas foram medidas com precisão. 

O TOI-3261 b revela-se um candidato ideal para testar novos modelos de computador de formação planetária. Parte da razão pela qual os Netunos quentes são tão raros é o fato de ser difícil manter uma espessa atmosfera gasosa tão perto de uma estrela. As estrelas são massivas e, por isso, exercem uma grande força gravitacional sobre o que as rodeia, o que pode despojar um planeta próximo das camadas de gás que possuem. Também emitem enormes quantidades de energia, o que "sopra" as atmosferas para longe. Estes dois fatores significam que os Netunos quentes podem ter começado a sua vida como planetas muito maiores, do tamanho de Júpiter, e desde então perderam uma grande parte da sua massa.

Ao modelar diferentes pontos de partida e cenários de desenvolvimento, a equipe científica determinou que o sistema tem cerca de 6,5 bilhões de anos e que o exoplaneta começou como um gigante gasoso muito maior. No entanto, é provável que tenha perdido massa de duas formas: fotoevaporação, quando a energia da estrela faz com que as partículas de gás se dissipem, e remoção por maré, quando a força gravitacional da estrela retira camadas de gás do planeta. O planeta pode também ter sido formado mais longe da sua estrela, onde estes dois efeitos seriam menos intensos, permitindo-lhe manter a sua atmosfera. 

A atmosfera remanescente do exoplaneta, uma das suas características mais interessantes, irá propiciar mais análises atmosféricas, talvez ajudando a desvendar a história da formação deste habitante cósmico. 

O exoplaneta TOI-3261 b é cerca de duas vezes mais denso do que Netuno, o que indica que as partes mais leves da sua atmosfera foram sendo eliminadas ao longo do tempo, deixando apenas os componentes mais pesados. Isto mostra que o exoplaneta deve ter começado com uma variedade de elementos diferentes na sua atmosfera, mas, nesta fase, é difícil dizer exatamente quais. Este mistério poderá ser resolvido observando o exoplaneta no infravermelho, talvez utilizando o telescópio espacial James Webb, uma forma ideal de ver as impressões digitais identificadoras das diferentes moléculas na atmosfera do planeta. Isto não só ajudará os astrônomos a compreender o passado de TOI-3261 b, mas também a começar a desvendar os processos físicos subjacentes a todos os planetas quentes e gigantes.

Um artigo sobre a descoberta foi publicado no periódico The Astronomical Journal.

Fonte: NASA

Uma supernova próxima podia pôr fim à procura pela matéria escura

A procura pela matéria escura do Universo podia terminar amanhã, caso houvesse uma supernova próxima e tivéssemos um pouco de sorte.

© Casey Reed (ilustração de estrela de nêutrons altamente magnetizada)

A natureza da matéria escura ilude os astrônomos há 90 anos, desde que se percebeu que 85% da matéria do Universo não é visível através dos nossos telescópios. Atualmente, o candidato mais provável à matéria escura é o áxion, uma partícula leve que está sendo desesperadamente procurada. 

Os astrofísicos da Universidade da Califórnia, em Berkeley, argumentam agora que o áxion podia ser descoberto segundos após a detecção de raios gama provenientes da explosão de uma supernova próxima. Os áxions, se existirem, seriam produzidos em quantidades abundantes durante os primeiros 10 segundos após o núcleo de uma estrela massiva colapsar numa estrela de nêutrons, e esses áxions escapariam e seriam transformados em raios gama altamente energéticos no intenso campo magnético da estrela. 

Uma tal detecção só é possível hoje em dia se o único telescópio de raios gama no espaço, o telescópio espacial Fermi, estiver apontando na direção da supernova no momento em que esta explode. Tendo em conta o campo de visão do telescópio, isso representa cerca de uma hipótese em 10. No entanto, uma única detecção de raios gama permitiria determinar a massa do áxion, em particular o chamado áxion QCD (Quantum ChromoDynamics), numa enorme gama de massas teóricas, incluindo intervalos de massas que estão agora sendo analisados em experiências na Terra. 

Contudo, a ausência de uma detecção eliminaria uma grande quantidade de massas potenciais para o áxion e tornaria irrelevante a maioria das atuais pesquisas por matéria escura. O problema é que, para que os raios gama sejam suficientemente brilhantes para serem detectados, a supernova tem de estar próxima, ou seja, dentro da Via Láctea ou de uma das suas galáxias satélite, e as estrelas próximas só explodem, em média, de poucas em poucas décadas. 

A última supernova próxima ocorreu em 1987 na Grande Nuvem de Magalhães, uma galáxia satélite da Via Láctea. Na ocasião, um telescópio de raios gama, o SMM (Solar Maximum Mission), apontava na direção da supernova, mas não era suficientemente sensível para detectar a intensidade prevista dos raios gama.

No entanto, os pesquisadores receiam que, quando a tão esperada supernova surgir no Universo próximo, não estejamos preparados para ver os raios gama produzidos pelos áxions. Os cientistas estão propondo a construção de telescópios de raios gama para avaliar a viabilidade de lançar um ou uma frota desses telescópios para cobrir 100% do céu 24 horas por dia e ter a certeza de apanhar qualquer explosão de raios gama. Até propuseram um nome para a sua constelação de satélites de raios gama de céu completo: GALAXIS (GALactic AXion Instrument for Supernova). 

A procura pela matéria escura centrou-se inicialmente nos tênues MACHOs (MAssive Compact Halo Objects), teoricamente espalhados pela nossa Galáxia e pelo cosmos, mas quando estes não se materializaram, os físicos começaram a procurar partículas elementares que teoricamente estão à nossa volta e deveriam ser detectáveis em laboratórios terrestres. Estas WIMPs (Weakly Interacting Massive Particles) também não foram detectadas.

Atualmente, o melhor candidato para a matéria escura é o áxion, uma partícula que se enquadra perfeitamente no modelo padrão da física e que resolve vários outros enigmas importantes da física de partículas. Os áxions também se enquadram perfeitamente na teoria das cordas, uma hipótese sobre a geometria subjacente do Universo, e pode ser capaz de unificar a gravidade, que explica as interações em escalas cósmicas, com a teoria da mecânica quântica, que descreve o infinitesimal.

O áxion teoricamente interage com toda a matéria, embora fracamente, através das quatro forças da natureza: gravidade, eletromagnetismo, a força forte, que mantém os átomos unidos, e a força fraca, que explica a quebra dos átomos. Uma das consequências é que, num campo magnético forte, um áxion pode ocasionalmente transformar-se numa onda eletromagnética, ou fóton. O áxion é distintamente diferente de outra partícula leve e de fraca interação, o neutrino, que apenas interage através da gravidade e da força fraca e ignora totalmente a força eletromagnética. 

As experiências de laboratório - como o Consórcio ALPHA (Axion Longitudinal Plasma HAloscope), o DMradio e o ABRACADABRA (A Broadband/Resonant Approach to Cosmic Axion Detection with an Amplifying B-field Ring Apparatus), todas elas envolvendo pesquisadores da UC Berkeley, utilizam cavidades compactas que, tal como um diapasão, ressoam e amplificam o fraco campo eletromagnético ou fóton produzido quando um áxion de baixa massa se transforma na presença de um forte campo magnético.

Em alternativa, os astrofísicos propuseram a procura de áxions produzidos no interior de estrelas de nêutrons imediatamente após uma supernova de colapso do núcleo, como SN 1987A. Até agora, no entanto, têm-se concentrado principalmente na detecção de raios gama resultantes da lenta transformação destes áxions em fótons nos campos magnéticos das galáxias. Porém, esse processo não é muito eficiente na produção de raios gama, ou pelo menos não o suficiente para ser detectado a partir da Terra. 

Ao invés, foi explorada a produção de raios gama por áxions nos fortes campos magnéticos em torno da própria estrela que os gerou. As simulações em supercomputador mostraram que esse processo cria, de forma muito eficiente, uma explosão de raios gama que depende da massa do áxion, e que a explosão deveria ocorrer simultaneamente com uma explosão de neutrinos do interior da estrela de nêutrons quente. 

As estrelas de nêutrons abrigam campos magnéticos muito fortes. Os campos magnéticos mais fortes do nosso Universo encontram-se em volta das estrelas de nêutrons, como os magnetares, que têm campos magnéticos dezenas de bilhões de vezes mais fortes do que qualquer coisa que possamos construir em laboratório. Isso ajuda a converter estes áxions em sinais observáveis

Há dois anos, os astrofísicos estabeleceram o melhor limite superior para a massa do áxion QCD em cerca de 16 milhões de elétrons-volt, ou seja, cerca de 32 vezes menos do que a massa do elétron. Este valor baseou-se na taxa de arrefecimento das estrelas de nêutrons, que arrefeceriam mais rapidamente se os áxions fossem produzidos juntamente com os neutrinos no interior destes corpos quentes e compactos. 

É previsto que uma detecção de raios gama permita identificar a massa do áxion QCD se esta for superior a 50 μeV (microelétrons-volt). Uma única detecção poderia reorientar as experiências existentes para confirmar a massa do áxion. Embora uma frota de telescópios de raios gama dedicados seja a melhor opção para detectar raios gama de uma supernova próxima, um golpe de sorte com o Fermi seria ainda melhor.

Um artigo foi publicado no periódico Physical Review Letters.

Fonte: University of California

terça-feira, 26 de novembro de 2024

Encontrado detalhes escaldantes sobre a jovem estrela FU Orionis

Em 1936, os astrônomos observaram um evento intrigante na constelação de Órion: a jovem estrela FU Orionis (FU Ori) tornou-se cem vezes mais brilhante numa questão de meses.

© JPL-Caltech (ilustração da estrela FU Orionis)

No seu pico, FU Ori era intrinsecamente 100 vezes mais brilhante do que o nosso Sol. No entanto, ao contrário de uma estrela em explosão, a sua luminosidade diminuiu apenas ligeiramente desde então. 

Agora, uma equipe de astrônomos utilizou as capacidades ultravioletas do telescópio espacial Hubble para aprender mais sobre a interação entre a superfície estelar de FU Ori e o disco de acreção que tem despejado gás sobre a estrela em crescimento durante quase 90 anos. Descobriram que o disco interior que toca a estrela é extraordinariamente quente, o que desafia a sabedoria convencional. As observações foram efetuadas com os instrumentos COS (Cosmic Origins Spectrograph) e STIS (Space Telescope Imaging Spectrograph) do telescópio. Os dados incluem os primeiros espetros no ultravioleta distante e no ultravioleta próximo de FU Ori.

Originalmente considerada como um caso único entre as estrelas, FU Ori exemplifica uma classe de estrelas jovens e eruptivas que sofrem mudanças dramáticas de brilho. Estes objetos são um subconjunto das estrelas T Tauri clássicas, que são estrelas em formação recente que estão se construindo através da acreção de material do seu disco e da nebulosa circundante. 

Nas estrelas T Tauri clássicas, o disco não toca diretamente na estrela porque é restringido pela pressão exterior do campo magnético da estrela. Os discos de acreção em torno de objetos tipo FU Ori, no entanto, são suscetíveis a instabilidades devido à sua enorme massa relativamente à estrela central, a interações com uma companheira binária ou a material em queda. Tal instabilidade significa que a taxa de acreção de massa pode mudar dramaticamente. 

O aumento do ritmo perturba o delicado equilíbrio entre o campo magnético estelar e a borda interior do disco, levando a que o material se aproxime e acabe por tocar na superfície da estrela. O aumento da taxa de material em queda e a proximidade do disco de acreção à estrela tornam os objetos FU Ori muito mais brilhantes do que uma típica estrela T Tauri. De fato, durante uma explosão, a própria estrela é ofuscada pelo disco. Além disso, o material do disco está orbitando rapidamente à medida que se aproxima da estrela, muito mais depressa do que a rotação da superfície estelar. Isto significa que deve haver uma região onde o disco impacta a estrela e o material abranda e aquece significativamente.

Em FU Ori, a temperatura é de 16.000 K [quase três vezes a temperatura da superfície do nosso Sol]. Esta temperatura escaldante é quase o dobro da calculada por modelos anteriores. Isto desafia-nos e encoraja-nos a pensar como é que um tal salto na temperatura pode ser explicado. Para resolver a diferença significativa de temperatura entre os modelos anteriores e as recentes observações do Hubble, a equipe oferece uma interpretação revista da geometria da região interior de FU Ori: O material do disco de acreção aproxima-se da estrela e, quando atinge a superfície estelar, produz-se um choque quente que emite muita luz ultravioleta. 

Compreender os mecanismos do rápido processo de acreção de FU Ori relaciona-se mais amplamente com ideias da formação e sobrevivência de planetas. O modelo revisto, baseado nos dados do Hubble, não é estritamente prejudicial para a evolução dos planetas, é uma espécie de mistura."Se o planeta estiver muito afastado no disco durante a sua formação, as explosões de um objeto FU Ori deverão influenciar o tipo de elementos químicos que o planeta acabará por herdar. Mas se um planeta em formação estiver muito próximo da estrela, a história é um pouco diferente. No espaço de algumas explosões, qualquer planeta que se esteja se formando muito perto da estrela pode mover-se rapidamente para o interior e acabar por se fundir com ela. 

Os astrônomos estão analisando cuidadosamente as várias linhas de emissão espectral de múltiplos elementos presentes no espectro obtido pelo COS. Isto deverá fornecer mais pistas sobre o ambiente de FU Ori, tal como a cinemática do gás que entra e sai da região interior.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: Space Telescope Science Institute

Descobertos novos blocos de construção de matéria orgânica complexa

Cientistas do Centro de Astrofísica do Harvard & Smithsonian (CfA)  liderarram a pesquisa que detectou uma nova molécula no espaço interestelar.

© NRAO / S. Dagnello (ilustração da molécula 1-cyanopyrene)

O elemento carbono é um bloco de construção para a vida, tanto na Terra quanto potencialmente em outros lugares nas vastas extensões do espaço. Deve haver muito carbono no espaço, mas surpreendentemente, nem sempre é fácil encontrá-lo. Embora possa ser observado em muitos lugares, não chega ao volume que os astrônomos esperariam ver.

A descoberta de uma nova molécula complexa (1-cianopireno) desafia as expectativas sobre onde os blocos de construção para o carbono são encontrados e como eles evoluem. Os astrônomos há muito tempo entenderam que certas estrelas ricas em carbono são fábricas de fuligem que liberam grandes quantidades de pequenas folhas moleculares de carbono no meio interestelar. Os cientistas pensavam, no entanto, que esses tipos de moléculas ricas em carbono não poderiam sobreviver às duras condições do espaço interestelar nem ser reformadas lá por química semelhante à combustão porque a temperatura é muito baixa.

A molécula de 1-cianopireno é composta de múltiplos anéis de benzeno fundidos. Ela pertence a uma classe de compostos conhecidos como Hidrocarbonetos Aromáticos Policíclicos (PAHs), que antes se acreditava que se formavam apenas em altas temperaturas em regiões com muita energia, como os ambientes ao redor de estrelas envelhecidas. Na Terra, os PAHs são encontrados na queima de combustíveis fósseis e como marcas de carvão em alimentos grelhados. 

Os astrônomos estudam os PAHs não apenas para aprender sobre seu ciclo de vida específico, mas para aprender mais sobre como eles interagem e revelam mais sobre o meio interestelar e os corpos celestes ao seu redor. Acredita-se que os PAHs sejam responsáveis ​​pelas bandas infravermelhas não identificadas observadas em muitos objetos astronômicos. Essas bandas surgem da fluorescência infravermelha dos PAHs após eles absorverem fótons ultravioleta (UV) das estrelas. A intensidade dessas bandas revela que os PAHs podem ser responsáveis ​​por uma fração significativa de carbono no meio interestelar.

No entanto, as moléculas de 1-cianopireno recentemente observadas foram encontradas na Nuvem Molecular de Touro-1 (TMC-1), uma nuvem interestelar fria. Localizada na constelação de Touro, a TMC-1 ainda não começou a formar estrelas, e a temperatura está apenas cerca de 10 graus acima do zero absoluto.

Os astrônomos usaram o telescópio Green Bank, o maior radiotelescópio totalmente direcionável do mundo, para descobrir o 1-cianopireno. Cada molécula tem um espectro rotacional único, como uma impressão digital, que permite sua identificação. No entanto, seu grande tamanho e a falta de um momento dipolar permanente podem tornar alguns PAHs difíceis de serem detectados. As observações do cianopireno podem fornecer evidências indiretas da presença de moléculas ainda maiores e mais complexas em observações futuras.

Os espectrômetros de micro-ondas desenvolvidos no CfA são instrumentos únicos e de classe mundial, projetados especificamente para medir as impressões digitais de rádio precisas de moléculas complexas como o 1-cianopireno. Previsões até mesmo das teorias químicas quânticas mais avançadas ainda são menos precisas do que o necessário para identificar essas moléculas no espaço com radiotelescópios, então experimentos em laboratórios como são indispensáveis para essas descobertas astronômicas inovadoras.

Um artigo descrevendo esses resultados foi publicado na revista Science.

Fonte: Harvard–Smithsonian Center for Astrophysics

sexta-feira, 22 de novembro de 2024

Revelado: O mais jovem exoplaneta em trânsito já detectado

Uma estrela passageira pode ter deformado um véu de poeira para expor o planeta embrionário.

© Springer Nature (exoplaneta TIDYE-1b)

Acredita-se que os planetas se formam dentro de discos de poeira e gás que circundam estrelas recém-nascidas. Mas esse ambiente nublado tende a proteger os planetas em desenvolvimento da vista, impedindo que os astrônomos observem sua formação diretamente.

Agora, por um golpe de sorte, um planeta ainda em formação foi detectado no início de seu processo de nascimento, graças ao que pode ter sido um encontro casual com uma estrela passageira que virou parte do disco de obscuridade para fora do caminho, expondo o planeta bebê. 

Anteriormente, o planeta mais jovem já detectado pelo método de trânsito, no qual o escurecimento da luz de uma estrela é medido quando um planeta cruza na frente dela, tinha cerca de 10 milhões de anos, tempo suficiente para a maior parte do disco empoeirado ter desaparecido. O novo planeta, catalogado como IRAS 04125+2902 b, tem apenas cerca de 3 milhões de anos. Sua estrela hospedeira ainda ostenta um grande disco de poeira externo, mas um que foi virado para ficar quase perpendicular a um disco interno esparso e à órbita do planeta recém-descoberto.

Como estrelas e planetas se formam a partir desses discos de matéria em colapso, e todo esse material deve estar no mesmo "ambiente tipo panqueca", esse disco bloquearia as observações da estrela. Mas descobriu-se que ao redor dessa estrela em particular, o disco externo por algum motivo se deformou e criou essa janela para a estrela que nos permitiu descobrir o planeta. 

Até agora, não estava claro que os planetas poderiam se formar tão rapidamente após o nascimento de sua estrela hospedeira. A Terra, por exemplo, levou algo entre 10 e 20 milhões de anos para se formar no disco natal do Sol. A estrela em si, IRAS 04125+2902, é parte de um sistema binário amplamente separado a cerca de 520 anos-luz de distância em Touro. 

A princípio, pensou-se que a atração da estrela companheira poderia ter sido responsável pela deformação do disco. Mas isso foi descartado, porque a estrela secundária acabou orbitando a primária no mesmo plano que o planeta recém-descoberto e o disco interno.

Essa descoberta foi feita com o Transiting Exoplanet Survey Satellite da NASA, ou TESS. Lançado em 2018 e liderado por astrônomos do Massachusetts Institute of Technology (MIT) e do Center for Astrophysics (CfA) do Harvard & Smithsonian, o TESS realiza uma pesquisa de todo o céu a cada dois anos desde então. Ele observou milhares de estrelas ao mesmo tempo para detectar o leve escurecimento de sua luz causado quando um planeta, em uma órbita que por acaso é de ponta, visto da Terra, passa na frente dela. Até agora, o TESS foi responsável pela descoberta de pelo menos 410 exoplanetas confirmados. 

Foram usados vários métodos para confirmar que o objeto detectado era de fato um planeta, como medir o grau de escurecimento em diferentes comprimentos de onda de luz. Se o objeto em trânsito fosse uma estrela em vez de um planeta, deveria haver variações no escurecimento em diferentes comprimentos de onda, porque a própria luz da estrela em trânsito estaria contribuindo para a mistura, mas nenhuma dessas variações foi encontrada. 

O planeta orbita sua estrela a cada 8,83 dias. O exoplaneta IRAS 04125+2902 b  foi apelidado de TIDYE-1b, uma referência à pesquisa TESS Investigation – Demographics of Young Exoplanets (TI-DYE), que agora acumulou sua primeira descoberta. 

O planeta é especialmente interessante porque pode cair em uma categoria intermediária entre planetas do tamanho de Netuno e mundos rochosos do tamanho da Terra. Esta categoria de sub-Netunos ou super-Terras é, na verdade, a classe de planetas mais comumente encontrada ao redor de outras estrelas. Estranhamente, não há planetas dessa faixa de tamanho em nosso Sistema Solar, então os detalhes de sua composição e formação permanecem relativamente desconhecidos.

O novo planeta tem cerca de 96% do diâmetro de Júpiter, mas menos de 30% da massa de Júpiter. A equipe concluiu que ele pode estar perdendo massa e pode acabar como uma super-Terra, tornando-se um objeto particularmente interessante para estudar. Ele pode ser potencialmente um alvo para observações do telescópio espacial James Webb, que pode fornecer dados espectroscópicos para revelar a composição do planeta e também ajudar a restringir a massa com mais precisão.

Um artigo foi publicado na revista Nature.

Fonte: Sky & Telescope

Anã branca e estrela da sequência principal em aglomerados abertos

Uma equipe de astrônomos descobriu a primeira população de candidatos a binários estelares compostos por uma anã branca e por uma estrela da sequência principal em aglomerados abertos.

© ALMA (sistema estelar HD 101584)

Esta descoberta ajudará a relacionar os estados inicial e final dos sistemas estelares binários, o que ajudará a informar os modelos de formação estelar, a evolução química da nossa Galáxia e até a maneira como a maioria dos elementos da tabela periódica foram criados. 

O estudo foi possível graças à utilização da aprendizagem de máquina para analisar dados provenientes de três fontes principais: a missão Gaia da ESA, um telescópio espacial que estudou mais de um bilhão de estrelas na Via Láctea, e observações dos levantamentos 2MASS e Pan-STARRS1. Este conjunto de dados, quando combinados, permitiu à equipe procurar novos binários em aglomerados com características semelhantes às dos pares conhecidos de anãs brancas e estrelas da sequência principal. 

A maioria das estrelas encontra-se agrupada em sistemas binários, ou seja, pares de estrelas que orbitam em torno de um centro de gravidade comum. De fato, quase metade de todas as estrelas semelhantes ao nosso Sol têm pelo menos uma estrela companheira. Estas estrelas emparelhadas diferem geralmente em tamanho, sendo uma estrela frequentemente mais massiva do que a outra. 

As estrelas mais massivas tendem a ter vidas mais curtas e a passar pelas fases de evolução estelar muito mais rapidamente do que as suas companheiras de menor massa. A fase principal da evolução de uma estrela é designada por fase da "sequência principal". É nesta fase que o hidrogênio está sendo fundido em hélio no núcleo da estrela. O nosso Sol é atualmente uma estrela da sequência principal, tal como cerca de 90 por cento das estrelas do Universo. Na fase em que uma estrela se aproxima do fim da sua vida, expande-se para centenas ou milhares de vezes o seu tamanho original durante a fase de gigante vermelha ou ramo assintótico das gigantes". 

Em sistemas binários íntimos, esta expansão é tão dramática que as camadas exteriores da estrela moribunda podem, por vezes, engolir completamente a sua companheira. Esta é a fase do "envelope comum", pois ambas as estrelas ficam envoltas no mesmo material. Esta fase de envelope comum e a forma como as estrelas espiralam juntas durante este período crítico continua sendo um dos maiores mistérios da astrofísica. Os cientistas ainda têm dificuldade em compreender como é que esta interação afeta a evolução subsequente das estrelas. 

Embora estes tipos de sistemas binários devessem ser muito comuns, têm sido difíceis de encontrar, com apenas dois candidatos confirmados em aglomerados antes desta investigação, que tem o potencial de aumentar este número para 52 binários em 38 aglomerados estelares. Uma vez que se pensa que as estrelas destes aglomerados se formaram todas ao mesmo tempo, encontrar estes binários em aglomerados abertos permite determinar a idade dos sistemas e traçar a sua evolução completa desde antes das condições de envelope comum até aos binários observados na sua fase pós-envelope comum.

Os binários que contêm objetos compactos são também os progenitores de um tipo de explosão estelar extrema chamada supernova de Tipo Ia e o tipo de fusão que cria ondas gravitacionais, ou seja, ondulações no espaço-tempo que podem ser detectadas por instrumentos como o LIGO (Laser Interferometer Gravitational-Wave Observatory). À medida que a equipe utiliza os dados dos telescópios Gemini, Keck e Magellan para confirmar e medir as propriedades destes binários, este catálogo acabará fornecendo detalhes dos muitos fenômenos transientes e elusivos do nosso Universo.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal.

Fonte: University of Toronto

A primeira imagem de uma estrela fora da Via Láctea

Pela primeira vez, foi obtida uma imagem de grande plano de uma estrela moribunda numa galáxia fora da Via Láctea.

© ESO / VLTI (estrela WOH G64)

A estrela WOH G64 situa-se a uns impressionantes 160.000 anos-luz de distância da Terra, mas ainda assim foi possível obter-se uma imagem sua extremamente nítida, graças à elevada resolução atingida pelo Interferômetro do Very Large Telescope (VLTI), do Observatório Europeu do Sul (ESO). 

As novas observações revelam que esta estrela se encontra expelindo gás e poeira, estando nas últimas fases de vida antes de explodir sob a forma de supernova. Foi descoberto um casulo em forma de ovo rodeando a estrela. 

Embora os astrônomos tenham obtido cerca de várias dezenas de imagens de grande plano de estrelas na nossa Galáxia, revelando assim as suas propriedades, existem inúmeras estrelas em outras galáxias tão distantes que observá-las em pormenor tem-se revelado extremamente difícil, pelo menos até agora. 

A estrela recentemente observada, WOH G64, situa-se na Grande Nuvem de Magalhães, uma das galáxias anãs que orbitam a Via Láctea, e os astrônomos sabem da sua existência desde há décadas. Com um tamanho de cerca de duas mil vezes superior ao do nosso Sol, a WOH G64 está classificada como uma estrela supergigante vermelha. 

Em 2005 e 2007, os pesquisadores utilizaram o VLTI no deserto chileno do Atacama, para aprender mais sobre as caraterísticas da estrela, tendo continuado a estudá-la nos anos seguintes. No entanto, obter uma imagem real da estrela revelava-se difícil. Com o desenvolvimento de um dos instrumentos de segunda geração do VLTI, o GRAVITY, surgiu a oportunidade de obter uma imagem desta estrela. Ao comparar os novos resultados com observações anteriores da WOH G64, os pesquisadores ficaram surpreendidos ao descobrir que a estrela se foi tornando cada vez mais tênue ao longo da última década.

Na fase final da sua vida, as supergigantes vermelhas como a WOH G64 liberam as suas camadas exteriores de gás e poeira, num processo que pode durar milhares de anos. Esta estrela é uma das mais extremas do seu gênero e qualquer mudança drástica pode aproximá-la de um fim explosivo. A equipe pensa que este material perdido pode ser igualmente responsável pelo escurecimento da estrela e pela forma incomum apresentada pelo casulo de poeira que a rodeia. A nova imagem mostra que o casulo está esticado, o que surpreendeu os cientistas, que esperavam uma forma diferente com base em observações anteriores e modelos de computador. 

Acredita-se que a forma em ovo do casulo pode ser explicada pela ejeção das camadas exteriores da estrela ou pela influência de uma estrela companheira ainda por descobrir. À medida que a WOH G64 se torna cada vez mais tênue, obter outras imagens de grande plano é cada vez mais difícil, mesmo com o VLTI. No entanto, as atualizações planejadas para a instrumentação do telescópio, como o futuro GRAVITY+, prometem mudar isto em breve.

Este trabalho foi descrito num artigo publicado no periódico Astronomy and Astrophysics.

Fonte: ESO