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sábado, 6 de setembro de 2025

Erupções solares são mais quentes do que se pensava

Uma nova pesquisa propôs que as partículas das erupções solares são 6,5 vezes mais quentes do que se pensava e forneceu uma solução inesperada para um mistério com 50 anos sobre a nossa estrela mais próxima.

© Solar Dynamics Observatory (Sol)

As erupções solares são súbitas e enormes liberações de energia na atmosfera exterior do Sol que aquecem partes da mesma a mais de 10 milhões de graus. Estes eventos dramáticos aumentam consideravelmente os raios X solares e a radiação que chega à Terra e são perigosos para as naves espaciais e para os astronautas, além de afetarem a atmosfera superior do nosso planeta.

O plasma solar é constituído por íons e elétrons. A nova pesquisa argumenta que os íons das erupções solares, partículas de carga positiva que constituem metade do plasma, podem atingir mais de 60 milhões de graus. Analisando os dados de outras áreas de pesquisa, a equipe, liderada pelo Dr. Alexander Russell, professor de Teoria Solar da Escola de Matemática e Estatística da Universidade de St. Andrews, percebeu que é muito provável que as erupções solares aqueçam mais os íons do que os elétrons, durante a reconexão magnética. Esta parece ser uma lei universal e foi confirmada no espaço próximo da Terra, no vento solar e em simulações de computador. No entanto, até agora ninguém tinha relacionado o trabalho nesses campos com as erupções solares.

A física solar tem historicamente assumido que os íons e os elétrons devem ter a mesma temperatura. No entanto, ao refazer os cálculos com dados modernos, foi descoberto que as diferenças de temperatura entre íons e elétrons podem durar até dezenas de minutos em partes importantes das erupções solares, abrindo caminho para considerar pela primeira vez íons superquentes. A nova temperatura dos íons corresponde bem à largura das linhas espectrais das erupções, o que pode resolver um mistério astrofísico que se mantém há quase meio século.

Desde a década de 1970 que se coloca a questão de saber por que razão as linhas espectrais das erupções, que são aumentos brilhantes da radiação solar em "cores" específicas no ultravioleta extremo e em raios X, são mais largas do que o esperado. Historicamente, pensava-se que este fato só poderia ser devido a movimentos turbulentos, mas essa interpretação tem estado sob pressão à medida que os cientistas tentam identificar a natureza da turbulência. Após quase 50 anos, o novo trabalho defende uma mudança de paradigma em que a temperatura dos íons pode dar uma grande contribuição para explicar as enigmáticas larguras de linha nos espectros das erupções solares.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: University of St Andrews

sábado, 16 de agosto de 2025

A influência dos planetas pode atenuar a atividade solar

O nosso Sol é cerca de cinco vezes menos magneticamente ativo do que outras estrelas semelhantes.

© Solar Dynamics Observatory (ejeção de massa coronal do Sol)

A razão para isso pode residir nos planetas do nosso Sistema Solar, afirmam pesquisadores do HZDR (Helmholtz-Zentrum Dresden-Rossendorf). Nos últimos dez anos, desenvolveram um modelo que deriva praticamente todos os ciclos de atividade conhecidos do Sol a partir da influência cíclica das forças de maré dos planetas. Agora, também conseguiram demonstrar que essa sincronização externa reduz automaticamente a atividade solar.

De momento, o Sol está atingindo um nível máximo de atividade que só é observado a cada onze anos, aproximadamente. É por isso que nós, na Terra, observamos mais auroras polares e tempestades solares, bem como um clima espacial turbulento em geral. Isto tem impacto nos satélites espaciais e até mesmo na infraestrutura tecnológica da Terra. Apesar disso, em comparação com outras estrelas semelhantes ao Sol, as erupções de radiação mais fortes do nosso Sol são 10 a 100 vezes mais fracas.

Este ambiente relativamente tranquilo pode ser uma condição prévia importante para a Terra ser habitável. Não menos importante por esta razão, os físicos solares querem compreender o que impulsiona precisamente a atividade solar. Sabe-se que a atividade solar tem muitos padrões, flutuações periódicas mais curtas e mais longas, que variam de algumas centenas de dias a vários milhares de anos. Mas há maneiras muito diferentes de explicar os mecanismos físicos subjacentes.

O modelo desenvolvido pela equipa liderada por Frank Stefani, do Instituto de Dinâmica de Fluidos do HZDR, vê os planetas como marca-passos: segundo essa compreensão, aproximadamente a cada onze anos, Vênus, Terra e Júpiter concentram as suas forças de maré combinadas no Sol. Através de um mecanismo físico complexo, de cada vez que o fazem, dão um pequeno empurrão ao impulso magnético interno do Sol. Em combinação com o movimento orbital em forma de roseta do Sol, isto leva a flutuações periódicas sobrepostas de durações variáveis, exatamente como observado no Sol.

No trabalho recente, os pesquisadores dão o nome OQB (Oscilação Quasi-Bienal), uma flutuação aproximadamente bianual em vários aspetos da atividade solar. O ponto especial aqui é que, a OQB não só pode ser atribuída a um período preciso, mas também leva automaticamente a uma atividade solar atenuada. Até agora, os dados solares geralmente relatavam períodos de OQB de 1,5 a 1,8 anos.

Em trabalhos anteriores, alguns pesquisadores sugeriram uma ligação entre a OQB e os chamados eventos GLE (Ground Level Enhancement). São ocorrências esporádicas durante as quais partículas solares ricas em energia provocam um aumento repentino da radiação cósmica na superfície da Terra. Um estudo realizado em 2018 mostra que os eventos de radiação medidos perto do solo ocorreram mais na fase positiva de uma oscilação com um período de 1,73 anos. Ao contrário da suposição habitual de que essas erupções de partículas solares são fenômenos aleatórios, esta observação indica um processo cíclico fundamental. Foi descoberto a maior correlação para um período de 1,724 anos. 

Apesar do campo magnético do Sol oscilar entre o mínimo e o máximo ao longo de um período de onze anos, a OQB impõe um padrão adicional de curto prazo na intensidade do campo. Isto reduz a intensidade geral do campo, pois o campo magnético do Sol não mantém o seu valor máximo por tanto tempo. Um diagrama de frequência revela dois picos: um na intensidade máxima do campo e outro quando a OQB oscila de volta. Este efeito é conhecido como bimodalidade do campo magnético solar. No modelo, os dois picos fazem com que a intensidade média do campo magnético solar seja reduzida, uma consequência lógica da OQB.

Este efeito é muito importante porque o Sol é mais ativo durante as intensidades de campo mais altas. É quando ocorrem os eventos mais intensos, com enormes tempestades geomagnéticas, como o evento Carrington de 1859, quando auroras polares puderam ser vistas até em Roma e Havana, e altas tensões danificaram linhas telegráficas. Se o campo magnético do Sol permanecer em intensidades de campo mais baixas por um período significativamente mais longo, no entanto, isso reduz a probabilidade de eventos muito violentos.

Um artigo foi publicado no periódico Solar Physics.

Fonte: HZDR

segunda-feira, 23 de junho de 2025

A nossa água é mais velha do que o Sol?

Uma equipe liderada por astrônomos da Universidade de Leiden, nos Países Baixos, e do NRAO (National Radio Astronomy Observatory), na Virgínia (EUA), detectou, pela primeira vez, água gelada semipesada em torno de uma jovem estrela semelhante ao Sol.

© STScI / Webb (sistema protoestelar L1527 IRS)

Os pesquisadores utilizaram o telescópio espacial James Webb, cujos resultados reforçam a hipótese de que parte da água no nosso Sistema Solar se formou antes do Sol e dos planetas.

Uma das formas de os astrônomos descobrirem a origem da água é através da medição da taxa de deuteração. Esta é a fração de água que contém um átomo de deutério em vez de um dos hidrogênios. Assim, em vez de H2O, é HDO, que também é chamada água semipesada. Uma fração elevada de água semipesada é um sinal de que a água se formou num local muito frio, como as nuvens escuras primitivas de poeira, gelo e gás de onde nascem as estrelas.

Nos nossos oceanos, nos cometas e nas luas geladas, uma em cada dois milhares de moléculas de água é constituída por água semipesada. Este valor é cerca de dez vezes superior ao esperado com base na composição do nosso Sol. Por isso, foi colocada a hipótese de parte da água do nosso Sistema Solar ter tido origem como gelo em nuvens escuras, centenas de milhares de anos antes do nascimento do Sol.

Para confirmar esta hipótese, é necessário medir a taxa de deuteração da água gelada nestas regiões de formação estelar. Astrônomos detectaram agora uma proporção muito elevada de água gelada semipesada num invólucro protoestelar. Esta é a nuvem de material que rodeia uma estrela na sua fase embrionária. Antes, a taxa de deuteração da água em regiões de formação estelar só podia ser medida de forma confiável na fase gasosa, onde pode ser quimicamente alterada. Agora, com a sensibilidade sem precedentes do Webb, foi observada uma assinatura muito clara de água gelada semipesada na direção da protoestrela L1527 IRS, localizada na constelação de Touro, a cerca de 460 anos-luz da Terra.

A taxa de deuteração da água em L1527 IRS é muito semelhante à taxa de alguns cometas, bem como ao do disco protoplanetário de uma estrela jovem mais evoluída, o que sugere origens químicas antigas e frias semelhantes para a água encontrada em todos estes objetos.

Esta descoberta vem juntar-se às evidências crescentes de que a maior parte da água gelada faz a sua viagem praticamente inalterada desde as primeiras até às últimas fases da formação estelar. No entanto, a taxa de deuteração da água gelada medido em L1527 IRS é ligeiramente superior às taxas medidas em alguns cometas do nosso Sistema Solar e à taxa de água na Terra.

Uma variedade de fatores pode causar esta diferença. Por exemplo, alguma da água nestes cometas e na Terra pode ter sido quimicamente alterada no disco. Ou a nuvem escura que formou o nosso Sol pode ser diferente da nuvem escura onde L1527 IRS se formou. Estão planejadas mais observações de água gelada semipesada para investigar possíveis razões para estas diferenças em 30 novas protoestrelas e nuvens escuras primitivas.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: Leiden University

Um eclipse solar artificial

A missão Proba-3 da ESA revelou as suas primeiras imagens da atmosfera exterior do Sol, a coroa solar.

© ESA (coroa interna do Sol)

Esta imagem, captada no espectro da luz visível, mostra a coroa solar de forma semelhante à que um olho humano veria durante um eclipse através de um filtro verde. As estruturas semelhantes a cabelos foram reveladas utilizando um algoritmo especializado de processamento de imagem.

Os dois satélites da missão, capazes de voar como uma única nave espacial graças a um conjunto de tecnologias de posicionamento a bordo, conseguiram criar o seu primeiro "eclipse solar total artificial" em órbita.

As imagens coronais resultantes demonstram o potencial das tecnologias de voo em formação, ao mesmo tempo que fornecem dados científicos de valor incalculável que irão melhorar a nossa compreensão do Sol e da sua enigmática atmosfera.

No passado mês de março, a missão Proba-3 conseguiu o que nenhuma outra tinha conseguido antes, um feito extraordinário possibilitado por um conjunto de tecnologias inovadoras de navegação e posicionamento. As suas duas naves espaciais, a 'Coronagraph' e a 'Occulter', voaram a 150 metros de distância em formação perfeita durante várias horas sem qualquer controle a partir do solo. Enquanto estiveram alinhadas, as duas naves mantiveram a sua posição relativa até um único milímetro.  Demonstrando o grau de precisão alcançado, as duas naves espaciais utilizam o seu tempo de voo em formação para criar eclipses solares totais artificiais em órbita, alinham-se com o Sol de modo a que o disco de 1,4 m de diâmetro transportado pela nave 'Occulter' cubra o disco brilhante do Sol para a nave 'Coronagraph', projetando uma sombra de 8 cm de diâmetro sobre o seu instrumento óptico, o ASPIICS (Association of Spacecraft for Polarimetric and Imaging Investigation of the Corona of the Sun). Quando a abertura de 5 cm está coberta pela sombra, o instrumento capta imagens da coroa solar sem ser interrompido pela luz brilhante do Sol.

A observação da coroa é crucial para revelar o vento solar, o fluxo contínuo de matéria do Sol para o espaço exterior. É também necessária para compreender o funcionamento das ejeções de massa coronal, explosões de partículas enviadas pelo Sol quase todos os dias, especialmente durante períodos de grande atividade. Estes eventos podem criar auroras espantosas no céu noturno, mas também representam sérias ameaças à tecnologia moderna. Podem perturbar significativamente as comunicações, a distribuição energética e os sistemas de navegação na Terra, como aconteceu em maio de 2024.

As imagens coronais resultantes das primeiras observações do ASPIICS fornecem um vislumbre dos dados valiosos que podemos esperar desta missão produtora de eclipses. A ardente coroa do Sol atinge temperaturas superiores a um milhão de graus Celsius, muito mais quente do que a superfície por baixo dela. O ASPIICS da Proba-3 está resolvendo este mistério estudando a coroa muito perto da superfície do Sol. Também consegue ver mais pormenores, detectando características mais tênues do que os coronógrafos tradicionais, graças a uma redução drástica da quantidade de luz "dispersa" que chega ao detector.

Juntamente com as medições efetuadas por outro instrumento a bordo, o DARA (Digital Absolute Radiometer), o ASPIICS contribuirá para desvendar questões de longa data sobre o Sol. O DARA medirá a irradiância solar total, exatamente a quantidade de energia que o Sol emite em cada momento. Um terceiro instrumento científico da missão Proba-3, o 3DEES (3D Energetic Electron Spectrometer), irá detectar elétrons nos cinturões de radiação da Terra, medindo a sua direção de origem e níveis de energia.

As imagens do eclipse artificial são comparáveis às obtidas durante um eclipse natural. A diferença é que é possível criar o eclipse uma vez em cada órbita de 19,6 horas, enquanto os eclipses solares totais só ocorrem naturalmente uma vez, muito raramente duas vezes por ano. Para além disso, os eclipses totais naturais duram apenas alguns minutos, enquanto a Proba-3 pode manter o seu eclipse artificial até 6 horas.

Fonte: ESA

sábado, 21 de setembro de 2024

Sombras distorcidas da superfície da Lua

Numa imagem obtida em 14 de outubro de 2023, são vistas sombras distorcidas da superfície da Lua criadas por um eclipse anular do Sol.

© Ryan Imperio (sombras distorcidas da superfície da Lua durante um eclipse anular do Sol)

Esta é uma sequência de imagens captadas continuamente mostrando a progressão das contas de Baily no terceiro contato, ou seja, durante o fim da anularidade, o momento em que a borda oeste da Lua revela o disco do Sol durante o eclipse anular. 

As contas de Baily são formadas quando a luz do Sol brilha através dos vales e crateras da superfície da Lua, quebrando o conhecido padrão de anéis do eclipse, e só são visíveis quando a Lua entra ou sai de um eclipse. Elas são um desafio para captar devido à sua brevidade e ao tempo preciso necessário. 

A imagem foi tirada pelo astrofotógrafo Ryan Imperio, que foi o vencedor geral do concurso Astronomy Photographer of the Year concedido pelo Royal Museums Greewich. 

Fonte: Royal Observatory

sábado, 11 de maio de 2024

Tempestades solares intensas

O Solar Dynamics Observatory (SDO) da NASA registrou duas intensas tempestades geomagnéticas nesta sexta-feira (10) às 22h23 (BRT) e neste sábado às 8h44. As explosões solares continuarão acontecendo até este domingo (12).

© SDO (explosões solares classe X)

As erupções são classificadas como erupções das classes X5.8 e X1.5, respectivamente. A imagem mostra um subconjunto de luz ultravioleta extrema que destaca o material extremamente quente em explosões criadas a partir de uma mistura dos canais AIA 193, 171 e 131 do SDO. Durante os últimos dias, a mancha solar gigante AR3664 disparou várias erupções que produziram ejeções de massa coronal.

Os fenômenos de classe X demonstram explosões mais intensas e o número classifica sua força. Dependendo de como impacta a Terra, essas tempestades podem interromper as comunicações, a energia elétrica, a navegação e as operações de rádio e satélite. Este fenômeno acontece quando há explosões no Sol com influência do campo magnético que expele plasma, ejetando massa coronal para o espaço. 

Elas causam tempestades geomagnéticas quando são direcionadas à Terra, gerando auroras na atmosfera terrestre, que neste incidente foram vistas em vários locais no hemisfério Norte (aurora boreal) e hemisfério Sul (aurora austral).

© AFP (aurora boreal)

A fotografia mostra a aurora boreal registrada em Fusch an der Großglocknerstraße na Áustria.

A maior tempestade solar registrada foi o "evento de Carrington", de 1859, que destruiu a rede telegráfica nos Estados Unidos, provocou descargas elétricas e a aurora boreal foi visível em latitudes inéditas, até a América Central.

As tempestades solares podem impactar algumas tecnologias usadas na superfície do planeta. Embora nem todas as tempestades solares causem grandes impactos, aquelas consideradas intensas podem afetar as operações de comunicação. 

As tempestades solares podem afetar os satélites e outras naves espaciais em órbita, alterando sua orientação ou potencialmente desativando seus componentes eletrônicos. As interações com a ionosfera podem bloquear ou degradar as transmissões de rádio. O clima espacial severo pode comprometer as redes elétricas, causando interferência no controle de tensão e sistemas de proteção.

Fonte: NASA

sábado, 6 de abril de 2024

Sol emitiu excesso de raios gama no último pico de atividade

Por sua proximidade e importância para a manutenção da vida na Terra, o Sol é a estrela mais pesquisada pelos astrofísicos.

© NASA (linhas do complexo campo magnético na superfície do Sol)

Esta situação de objeto de estudo preferencial não significa que há pouco a se descobrir sobre o astro. Ao contrário, alguns tipos de pesquisa, como as de longo prazo, só podem ser realizados porque nosso planeta está, sempre, nas vizinhanças do Sol. Assim, é possível observá-lo de forma contínua e perceber detalhes que não podem ser conferidos em estrelas mais distantes. Foi justamente essa particularidade que permitiu um achado recente. 

O estudo realizado pelo brasileiro Bruno Arsioli e a italiana Elena Orlando relata que o Sol emitiu um excesso inesperado de raios gama de alta energia em seus polos. A maior concentração de radiação ocorreu durante seu último período mais ativo, o chamado máximo solar, em junho de 2014. 

Como a Terra, o Sol gira em torno de um eixo, cujas extremidades definem os polos. A rotação gera o campo magnético, de forma que os polos magnéticos coincidem com as pontas do eixo de rotação. Segundo os autores do trabalho, o esperado era que, quando houvesse variações no nível das emissões de raios gama, tais flutuações se manifestassem com a mesma intensidade em todas as áreas do Sol, de forma mais ou menos homogênea, em vez de se concentrarem exageradamente nas zonas de alta latitude. Essa maior concentração de emissões de raios gama foi observada no momento em que ocorreu a inversão dos polos magnéticos do Sol. Por isso, suspeita-se que a reconfiguração magnética esteja relacionada com a produção excessiva de radiação gama nos polos. A troca faz com que o polo magnético do sul migre para o norte do disco solar e vice-versa. Tal inversão ocorre em média a cada onze anos, durante o máximo solar. 

Atualmente, Bruno Arsioli é pesquisador no Instituto de Astrofísica e Ciências Espaciais da Universidade de Lisboa, em Portugal. Elena Orlando é pesquisadora da Universidade de Trieste, Itália. Arsioli iniciou o estudo com dados do Fermi em 2021, quando passou um ano associado ao grupo da italiana na Universidade de Trieste. 

Inédito, o resultado foi obtido a partir da análise de dados referentes a 13 anos e meio de observação do Sol, entre agosto de 2008 e janeiro de 2022, pelo telescópio espacial Fermi, que é dedicado a registrar emissões em frequências da radiação gama, a porção mais energética do espectro eletromagnético. Recentemente foi usado também para estudar uma misteriosa explosão de raios gama, a segunda mais intensa que se observou no espaço, ocasionada provavelmente pela rara fusão de duas estrelas de nêutrons. 

O trabalho de análise das emissões do Sol foi feito em etapas. Primeiramente, Arsioli e Orlando dividiram os dados coletados, que abrangeram um ciclo solar inteiro, em intervalos menores, de 400 a 700 dias. Em seguida, com o emprego de ferramentas de análise de dados por eles desenvolvidas, compararam as emissões de raios gama com energia acima de 5 gigaelétron-volt (GeV) de cada subperíodo em todas as regiões do disco solar. Dessa forma, notaram a concentração de produção de emissões de altas energias nas zonas polares durante o máximo solar. A constatação é amparada por testes estatísticos, descritos no trabalho, que indicam a relevância dos sinais observados. 

Considerado um astro comum entre as mais de 100 bilhões de estrelas da Via Láctea, o Sol se formou há cerca de 4,5 bilhões de anos. Diferente da Terra e da Lua, ele não é um corpo sólido. É uma bola de plasma quente (matéria ionizada, com partículas carregadas eletricamente), constituída pelos gases hidrogênio e hélio. O nível de atividade solar (produção de energia) varia ao longo do tempo de forma mais ou menos regular, em ciclos. 

A duração média de um ciclo solar é de 11 anos, mas pode variar entre 9 e 14 anos. A formação de manchas solares, pontos pretos associadas a áreas mais frias na superfície, é um termômetro da atividade solar. Ocasionalmente, as maiores manchas são visíveis da Terra sem a necessidade de recorrer a telescópios. Mais manchas sinalizam que o astro está funcionando em ritmo acelerado. A dinâmica energética do Sol também está associada a outros fenômenos, como a ocorrência de flares (erupções) e ejeções de massa coronal. 

Entre o momento de maior e o de menor atividade, a diferença de brilho, ou seja, de produção de energia, do Sol é muito pequena, de no máximo 0,1%. Por isso, os climatologistas descartam que variações na atividade solar possam influir de forma significativa no aumento do aquecimento global. Segundo cálculos da NASA, ao longo dos dois últimos séculos, o peso acumulado das emissões de gases de efeito estufa provenientes de atividades humanas sobre a temperatura média da Terra é pelo menos 270 vezes maior do que a possível influência de qualquer alteração de luminosidade do Sol. 

Ainda assim, as alterações em seu regime de funcionamento produzem impactos evidentes na aparência e no comportamento da estrela. Além de gerar conhecimento básico sobre a física estelar, os estudos sobre a atividade solar são úteis para entender os impactos reais que o astro pode ter sobre diferentes aspectos da vida cotidiana na Terra. Ao emitir mais radiação e matéria na direção do Sistema Solar, a estrela pode afetar os sistemas de navegação terrestre, como o GPS, e as telecomunicações no planeta. Para o astrofísico Rodrigo Nemmen, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP), que não participou do artigo, os dados do trabalho de Arsioli e Orlando são importantes para melhorar o entendimento sobre o funcionamento da superfície do Sol. 

Um dos desafios de Arsioli e Orlando é tentar observar novamente o pico de emissão de raios gama nas regiões polares do Sol durante o próximo máximo solar, que deve ocorrer em 2025. Se a estrela se comportar novamente como em junho de 2014, a ideia de que a produção excessiva de raios gama decorre da inversão periódica dos polos magnéticos se torna mais robusta.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal

Fonte: Revista FAPESP

sexta-feira, 18 de agosto de 2023

Encontrada uma anã marrom mais quente que o Sol

Esta estrela fracassada é irradiada por sua companheira, uma anã branca, e pode ser usada para estudar Júpiteres quentes.

© NASA (ilustração de uma anã marrom)

Um sistema binário a 1.400 anos-luz de distância está aumentando o calor e pode ajudar os especialistas a entender melhor a classe de exoplanetas conhecidos como Júpiteres ultraquentes, gigantes gasosos que estão muito próximos de suas massivas estrelas hospedeiras. 

O sistema único descrito em um novo estudo inclui uma anã marrom cuja temperatura atinge aproximadamente 7.700 °C. Isso o torna mais quente que o Sol, cuja superfície é de 5.500 °C. Mas, as temperaturas sufocantes da anã marrom não são geradas por nenhuma reação nuclear interna própria: em vez disso, ela orbita muito perto de sua companheira, uma anã branca chamada WD 0032-317, que a está explodindo com emissão de radiação. O lado noturno da anã marrom, ou seja, o lado voltado para longe da anã branca, é quase 6.000 °C mais frio. 

Este par de estrelas pode ajudar os cientistas a aprender mais sobre exoplanetas que orbitam muito perto de estrelas massivas e quentes. Os intensos surtos de radiação ultravioleta dessas estrelas podem fazer com que as atmosferas desses planetas evaporem e até vaporizem seu material planetário. Mas, esse processo é difícil de estudar. 

Um sistema anã branca e anã marrom pode servir como um análogo para um sistema de Júpiter ultraquente, que é muito mais fácil de observar. Análogos de Júpiter fornecem uma maneira indireta de estudar as atmosferas de planetas gigantes porque as anãs marrons devem ter atmosferas muito semelhantes às dos planetas gigantes gasosos.

O sistema WD 0032–317 foi observado pela primeira vez por astrônomos que realizaram um levantamento de centenas de anãs brancas no início dos anos 2000 com o Very Large Telescope (VLT) no Observatório Paranal, no Chile. 

Uma anã branca é uma estrela que atingiu a fase final de sua vida, depois de se expandir para uma gigante vermelha quando seu combustível acaba, ela explode suas camadas externas, tudo o que resta é o núcleo quente e inerte. 

O WD 0032–317 foi inicialmente sinalizado como um sistema binário de duas anãs brancas; mas, quando os astrônomos revisitaram os dados, eles viram sinais que eram mais reveladores de uma companheira anã marrom. 

As anãs marrons não são planetas nem estrelas, mas objetos intermediários: pelo menos 13 vezes mais massivas que Júpiter, mas não massivas o suficiente para gerar o calor e a pressão necessários para fundir o hidrogênio em hélio. Por esse motivo, às vezes são chamadas de estrelas fracassadas. 

A anã marrom também pode ser uma das maiores já encontradas, pesando de 75 a 88 vezes a massa de Júpiter. Em observações de acompanhamento, os pesquisadores viram uma emissão vindo do lado sempre voltado para a anã branca. Ele foi originalmente perdido há duas décadas porque as observações originais foram feitas quando o lado noturno da companheira estava voltado para o telescópio. Nos novos dados, o lado diurno da anã marrom está voltado para o telescópio. 

Os astrônomos conhecem apenas um outro exemplo deste fenômeno: KELT-9b, que é tão quente que espalha material por trás dele, imitando a cauda de um cometa. A dificuldade de encontrar Júpiteres ultraquentes se deve em parte ao brilho de suas grandes estrelas hospedeiras próximas. Para complicar ainda mais as coisas, essas estrelas giram rapidamente e são propensas a tempestades estelares. 

Os astrônomos geralmente medem a massa de um exoplaneta medindo o desvio para o vermelho e o desvio para o azul das linhas espectrais da estrela hospedeira conforme a estrela oscila devido à atração gravitacional do exoplaneta. Mas quando uma grande estrela está girando rapidamente e explodindo, o movimento rápido do material da estrela torna mais difícil para discernir a oscilação da estrela. 

Por essas razões, os astrônomos estão interessados em usar anãs marrons que orbitam anãs brancas como análogos de Júpiteres ultraquentes. Os tamanhos relativos desses objetos tornam a anã marrom mais fácil de observar: uma anã marrom tem aproximadamente o mesmo diâmetro de um Júpiter quente, mas as anãs brancas são muito menores do que a maioria das estrelas, aproximadamente do tamanho da Terra. No entanto, eles ainda podem liberar calor residual suficiente para queimar companheiros próximos: no caso de WD 0032–317, a quantidade de radiação ultravioleta extrema que a anã marrom recebe de sua anã branca é 5.600 vezes maior que a de KELT-9b. 

Além de ser um modelo para Júpiteres ultraquentes, o sistema WD 0032–317 também oferece aos cientistas uma visão da evolução das estrelas. Com base em modelos de evolução estelar, a anã marrom parece ter pelo menos alguns bilhões de anos. Mas a anã branca ainda é incrivelmente quente, indicando que faz apenas cerca de 1 milhão de anos desde que se tornou uma anã branca. Além do mais, a anã branca tem uma massa de cerca de 0,4 vezes a do Sol. 

De acordo com a teoria, uma anã branca tão pequena não pode existir por conta própria, levaria uma estrela de massa tão baixa por mais tempo do que a idade do Universo para atingir sua fase de anã branca. Suspeita-se que a anã marrom ajudou a colocar a anã branca no estado em que se encontra hoje porque, em certo momento, elas compartilharam um envelope comum. A evolução do envelope comum é uma fase na vida de uma estrela binária em que duas estrelas ou objetos orbitam dentro de um envelope compartilhado de gás. Nesse caso, o envelope comum se desenvolveu quando a estrela primária se expandiu para uma gigante vermelha, envolvendo a anã marrom. A anã marrom pode ter ajudado a estrela primária a perder parte de sua massa e se tornar uma anã branca antes do esperado para uma única estrela.

Fonte: Astronomy