Mostrando postagens com marcador Supernovas. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Supernovas. Mostrar todas as postagens

quinta-feira, 31 de outubro de 2024

Supernova em forma de dente-de-leão e uma estrela zumbi

Uma supernova histórica, documentada por astrônomos chineses e japoneses em 1181, esteve perdida durante séculos, até muito recentemente.

© Adam Makarenko (ilustração do remanescente de supernova Pa 30)

No entanto, o remanescente recentemente encontrado apresenta algumas características impressionantes. Agora, revela os seus segredos. 

Uma equipe liderada por Tim Cunningham, do Centro de Astrofísica do Harvard & Smithsonian, e por Ilaria Caiazzo, professora assistente do ISTA (Institute of Science and Technology Austria), fornece o primeiro estudo detalhado da estrutura da supernova e da sua velocidade de expansão em 3D. 

Em 1181, uma nova estrela brilhou perto da constelação de Cassiopeia durante seis meses antes de desaparecer. Este acontecimento, registado como uma "estrela convidada" por observadores chineses e japoneses há quase um milênio, intrigou os astrônomos durante séculos. É uma das poucas supernovas que foram documentadas antes da invenção dos telescópios. Além disso, foi a que permaneceu mais tempo "órfã", o que significa que nenhum dos objetos celestes hoje visíveis lhe podia ser atribuído. 

Atualmente conhecida como supernova SN 1181, o seu remanescente só foi localizado em 2021 na nebulosa Pa 30, descoberta em 2013 pelo astrônomo amador Dana Patchick enquanto examinava um arquivo de imagens do telescópio WISE no âmbito de um projeto de ciência cidadã. Mas esta nebulosa não é um típico remanescente de supernova. O intrigante é a presença de uma "estrela zumbi" sobrevivente no seu centro, um remanescente dentro do remanescente.

Pensa-se que SN 1181 tenha ocorrido quando uma explosão termonuclear foi desencadeada numa estrela densa e morta chamada anã branca. Normalmente, a anã branca seria completamente destruída neste tipo de explosão, mas neste caso, parte da estrela sobreviveu, deixando para trás um cadáver estelar. A este tipo de explosão parcial chama-se uma supernova do Tipo Iax. Mais intrigante ainda é o fato de desta estrela zumbi saírem estranhos filamentos, semelhantes às pétalas de uma flor de dente-de-leão. 

Agora, os pesquisadores obtiveram uma visão detalhada e sem precedentes destes estranhos filamentos. Foi possível estudar em pormenor este estranho remanescente de supernova graças ao KCWI (Keck Cosmic Web Imager) do Caltech. O KCWI é um espectrógrafo situado a 4.000 metros de altitude no Observatório W. M. Keck, no Havaí, perto do cume do vulcão Mauna Kea, o pico mais alto da ilha. Como o seu nome indica, o KCWI foi concebido para detectar algumas das fontes de luz mais tênues e escuras do Universo, coletivamente designadas por "teia cósmica". Além disso, o KCWI é tão sensível e inteligentemente concebido que consegue captar informação espectral para cada pixel de uma imagem. Pode também medir o movimento da matéria numa explosão estelar, criando algo como um filme 3D de uma supernova. O KCWI examina a forma como a luz se desloca quando se aproxima ou se afasta de nós, um processo físico semelhante ao conhecido efeito Doppler que conhecemos das sirenes que mudam de tom quando uma ambulância passa por nós. 

Assim, em vez de verem apenas a típica imagem estática de um espetáculo de fogo de artifício comum às observações de supernovas, foi criado um mapa 3D detalhado da nebulosa e dos seus estranhos filamentos. Além disso, foi mostrado que o material nos filamentos viajava balisticamente a cerca de 1.000 quilómetros por segundo.

Para além dos filamentos em forma de dente-de-leão e da sua expansão balística, a forma geral da supernova é muito incomum. A equipe conseguiu demonstrar que o material dentro dos filamentos que é ejetado para longe do local da explosão é incomumente assimétrica. Isto sugere que a assimetria tem origem na própria explosão inicial. Além disso, os filamentos parecem ter uma orla interna aguçada, mostrando uma "lacuna" interna em torno da estrela zumbi.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal Letters

Fonte: Harvard–Smithsonian Center for Astrophysics

sábado, 26 de outubro de 2024

Descoberto o primeiro buraco negro num sistema triplo

Muitos dos buracos negros detectados até o momento parecem fazer parte de um par.

© Jorge Lugo (estrela distante e buraco negro consumindo estrela próxima)

Estes sistemas binários são constituídos por um buraco negro e um objeto secundário, como uma estrela, uma muito mais densa estrela de nêutrons ou outro buraco negro, que giram em volta um do outro, atraídos pela gravidade do buraco negro para formar um par orbital íntimo.

Agora, uma descoberta surpreendente está expandindo a nossa imagem dos buracos negros, dos objetos que podem abrigar e da maneira como se formam. Num estudo, físicos do MIT (Massachusetts Institute of Technology) e do Caltech (California Institute of Technology) afirmam ter observado pela primeira vez um sistema triplo que conta com a presença de um buraco negro. O novo sistema contém um buraco negro central que está consumindo uma pequena estrela e que completa uma órbita a cada 6,5 dias, uma configuração semelhante à maioria dos sistemas binários. 

Mas, surpreendentemente, uma segunda estrela parece estar também orbitando o buraco negro, embora a uma distância muito maior. Os físicos estimam que esta companheira distante complete uma órbita em torno do buraco negro a cada 70.000 anos. O fato de o buraco negro parecer ter influência gravitacional sobre um objeto tão distante está levantando questões sobre as origens do próprio buraco negro. 

Pensa-se que os buracos negros se formam a partir da explosão violenta de uma estrela moribunda, um processo conhecido como supernova, através do qual uma estrela libera uma enorme quantidade de energia e luz numa explosão final antes de colapsar para formar um buraco negro invisível. No entanto, a descoberta da equipe sugere que, se o buraco negro recém-observado resultasse de uma supernova típica, a energia que teria liberado antes de entrar em colapso teria ejetado quaisquer objetos fracamente ligados na sua periferia.

A segunda estrela, a mais externa, não deveria, portanto, estar ainda por perto. Ao invés, suspeita-se que o buraco negro se formou através de um processo mais gentil de "colapso direto", no qual uma estrela simplesmente colapsa sobre si própria, formando um buraco negro sem um último dramático fulgor. 

Uma origem tão gentil dificilmente perturbaria quaisquer objetos distantes e fracamente ligados pela gravidade. Como o novo sistema triplo inclui uma estrela muito distante, isto sugere que o buraco negro do sistema nasceu através de um colapso mais gentil e direto. E embora os astrônomos já observem há séculos supernovas mais violentas, a equipe afirma que o novo sistema triplo pode ser a primeira evidência de um buraco negro que se formou a partir deste processo mais moderado. 

Este sistema é muito interessante para a evolução dos buracos negros e também levanta a questão de saber se existem mais triplos por aí. A descoberta do buraco negro neste sistema triplo surgiu quase por acaso. Os físicos descobriram-no enquanto pesquisavam no Aladin Lite, um repositório de observações astronômicas, agregadas a partir de telescópios no espaço e em todo o mundo. Os astrônomos podem utilizar a ferramenta online para procurar imagens da mesma parte do céu, tiradas por diferentes telescópios que estão sintonizados para vários comprimentos de onda de energia e luz. 

A equipe tem vindo a procurar sinais de novos buracos negros na Via Láctea. Por curiosidade, foi analisada uma imagem de V404 Cygni, um buraco negro a cerca de 8.000 anos-luz da Terra que foi um dos primeiros objetos a ser confirmado como buraco negro, em 1992. Desde então, V404 Cygni tornou-se um dos buracos negros mais estudados, tendo sido documentado em mais de 1.300 artigos científicos. 

Ao olhar para as imagens ópticas de V404 Cygni, astrônomos viram o que pareciam ser duas manchas de luz, surpreendentemente próximas uma da outra. A primeira mancha era o que outros determinaram ser o buraco negro e uma estrela interior, que orbitava muito perto. A estrela está tão próxima que está derramando algum do seu material sobre o buraco negro, emitindo a luz que pode ser observada. A segunda mancha de luz, no entanto, foi algo que os cientistas não investigaram rigorosamente, até agora. 

A estrela exterior está a 3.500 UA do buraco negro (1 UA, ou unidade astronômica, é a distância entre a Terra e o Sol, cerca de 150 milhões de quilômetros), que é também igual a 100 vezes a distância entre Plutão e o Sol. 

A questão que se colocou então foi a de saber se a estrela exterior estaria ligada ao buraco negro e à sua estrela interior. Para responder a esta questão, os pesquisadores recorreram ao Gaia, um satélite que, desde 2014, tem seguido com precisão os movimentos de muitas estrelas da nossa Galáxia. A equipe analisou os movimentos da estrela interior e da exterior ao longo dos últimos 10 anos de dados do Gaia e descobriu que as estrelas se moviam exatamente em conjunto, em comparação com outras estrelas vizinhas. Foi calculado que a probabilidade deste tipo de movimento em conjunto é de cerca de uma em 10 milhões.

Como é que o sistema foi formado? Se o buraco negro tivesse surgido de uma supernova típica, a explosão violenta teria ejetado a estrela exterior há muito tempo. Para realmente testar esta ideia, foram efetuadas simulações para ver como um tal sistema triplo poderia ter evoluído e retido a estrela exterior. No início de cada simulação, introduziu três estrelas (sendo a terceira o buraco negro, antes de se tornar um buraco negro). Em seguida, executou milhares de simulações, cada uma com um cenário ligeiramente diferente de como a terceira estrela poderia ter-se tornado um buraco negro, afetando subsequentemente os movimentos das outras duas estrelas.

Por exemplo, simulou uma supernova, variando a quantidade e a direção da energia que liberava. Simulou também cenários de colapso direto, em que a terceira estrela simplesmente colapsava sobre si própria para formar um buraco negro, sem emitir qualquer energia.

Para além de dar pistas sobre as origens do buraco negro, a estrela exterior também revelou a idade do sistema. Os físicos observaram que a estrela exterior está no processo de se tornar uma gigante vermelha, uma fase que ocorre no fim da vida de uma estrela. Com base nesta transição estelar, determinou-se que a estrela exterior tem cerca de 4 bilhões de anos. Dado que as estrelas vizinhas nascem mais ou menos no mesmo momento, conclui-se que o sistema triplo tem também 4 bilhões de anos.

Um artigo foi publicado na revista Nature.

Fonte: Massachusetts Institute of Technology

sexta-feira, 11 de outubro de 2024

Dúzias de estrelas massivas lançadas de jovem aglomerado estelar

Astrônomos utilizaram dados do telescópio espacial Gaia da ESA para descobrir 55 estrelas velozes lançadas do jovem aglomerado estelar R136 na Grande Nuvem de Magalhães, uma galáxia satélite da Via Láctea.

© STScI (ilustração do aglomerado estelar R136)

Este fato aumenta dez vezes o número de "estrelas em fuga" conhecidas nesta região. Quando os aglomerados estelares se formam, as estrelas recém-nascidas movem-se de forma cruzada e quase que roçam entre si, o que pode resultar na ejeção de estrelas para fora do jovem aglomerado. 

Os astrónomos descobriram que o jovem aglomerado estelar R136 ejetou praticamente um-terço das suas estrelas mais massivas nos últimos milhões de anos, a velocidades superiores a 100.000 km/h. Estas estrelas viajaram até 1.000 anos-luz do seu local de nascimento antes de explodirem como supernovas no final da sua vida, produzindo uma estrela de nêutrons ou um buraco negro. 

Outra descoberta surpreendente: não houve um único período em que as estrelas foram dinamicamente ejetadas, mas sim dois. O primeiro episódio ocorreu há 1,8 milhões de anos, quando o aglomerado se formou. O segundo episódio ocorreu há apenas 200.000 anos e tinha características muito diferentes. Por exemplo, as estrelas em fuga deste segundo episódio movem-se mais lentamente e não são disparadas em direções aleatórias como no primeiro episódio, mas numa direção preferencial. Os pesquisadores pensam que o segundo episódio de expulsão estelar se deveu à interação de R136 com outro aglomerado próximo (que só foi descoberto em 2012). O segundo episódio pode prever que os dois aglomerados se vão misturar e fundir num futuro próximo. 

As estrelas massivas eventualmente explodem como supernovas. Durante a sua vida, são extremamente brilhantes, até mais de um milhão de vezes mais brilhantes do que o Sol, e emitem principalmente luz ultravioleta que ioniza o gás hidrogênio circundante. Vivem apenas durante um curto período de tempo (milhões de anos) e normalmente ainda explodem na região de formação estelar em que nasceram. Esta região de formação estelar é constituída por nuvens de gás e poeira que amortecem o efeito que as estrelas massivas têm no seu meio envolvente.

Esta é a primeira vez que se encontra um número tão grande (55) de estrelas de alta velocidade originárias de um único aglomerado. O R136 é um aglomerado muito especial, com centenas de milhares de estrelas, incluindo as estrelas mais massivas conhecidas (até 300 vezes a massa do Sol). Faz parte da maior região de formação estelar conhecida num raio de cinco milhões de anos-luz. É possível que as estrelas fugitivas formadas no início do Universo tenham dado uma contribuição importante para a chamada reionização do Universo causada pela luz ultravioleta. 

Os astrônomos utilizaram dados do telescópio Gaia da ESA, que mede as posições, distâncias e velocidades de mais de um bilhão de estrelas. O Gaia está localizado muito para além da Lua, a uma distância de 1,5 milhões de quilômetros da Terra. O principal objetivo da equipe era testar os limites das capacidades do Gaia. 

O R136 está localizado na Grande Nuvem de Magalhães, uma galáxia irmã da Via Láctea, a uma distância de 160.000 anos-luz. É uma distância muito grande para as medições do Gaia. Este aglomerado estelar se formou há apenas 1,8 milhões de anos e, por isso, as estrelas em fuga não podem ainda estar tão longe que se torne impossível identificá-las. Ao conseguir encontrar muitas destas estrelas, será possível fazer afirmações estatísticas confiáveis.

Um artigo foi publicado na revista Nature.

Fonte: NOVA

terça-feira, 24 de setembro de 2024

Os arredores de um buraco negro e de um remanescente de supernova

O XRISM (X-Ray Imaging and Spectroscopy Mission) revelou a estrutura, o movimento e a temperatura do material em torno de um buraco negro supermassivo e num remanescente de supernova com um pormenor sem precedentes.

© JAXA (ilustração da região central de um núcleo galáctico ativo)

Os astrônomos apresentaram os primeiros resultados científicos do novo telescópio de raios X menos de um ano após o seu lançamento. 

O que é que um buraco negro gigantesco e os restos de uma estrela massiva que explodiu têm em comum? São ambos fenômenos celestes dramáticos em que um gás extremamente quente produz raios X altamente energéticos que o XRISM consegue ver. Nos seus primeiros resultados, a missão liderada pela JAXA (Japan Aerospace Exploration Agency), com a participação da ESA (European Space Agency), mostra as suas capacidades únicas para revelar a velocidade e a temperatura do gás quente, chamado plasma, e as estruturas tridimensionais do material que rodeia um buraco negro e uma explosão estelar. 

Numa das suas observações de "primeira luz", o XRISM focou-se no remanescente de supernova N132D, localizado na Grande Nuvem de Magalhães a cerca de 160.000 anos-luz da Terra. Esta "bolha" interestelar de gás quente foi expelida pela explosão de uma estrela muito massiva há cerca de 3.000 anos. Usando o seu instrumento Resolve, o XRISM desvendou a estrutura em torno de N132D com grande pormenor. 

Contrariamente às suposições anteriores de uma simples concha esférica, os cientistas descobriram que o N132D tem a forma de uma rosquinha. Usando o efeito Doppler, mediram a velocidade a que o plasma quente no remanescente se move em direção a nós ou para longe de nós, e estabeleceram que este está se expandindo a uma velocidade aparente de cerca de 1.200 km/s.

© JAXA (gráfico da temperatura e energia do remanescente N132D)

Esta imagem mostra a observação do telescópio de raios X XRISM da JAXA do remanescente de supernova N132D. No topo da imagem, o remanescente de supernova é visto em raios X. O círculo amarelo representa a área onde o instrumento Resolve do XRISM revelou que o remanescente contém ferro extremamente quente (10 bilhões Kelvin). A linha rosa mostra a borda do remanescente, onde a onda de explosão interage com o meio interestelar, e o gás quente (plasma) é mais frio (cerca de 10 milhões Kelvin).

O espectro mostra muitos elementos químicos que estão presentes no remanescente de supernova N132D. O XRISM pode identificar cada elemento medindo a energia do fóton de raios X específico dos diferentes átomos.

Os átomos de ferro foram aquecidos durante a explosão de supernova através de violentas ondas de choque que se propagam para o interior, um fenômeno que tinha sido previsto pela teoria, mas nunca antes observado. Os remanescentes de supernova como N132D contêm pistas importantes sobre a forma como as estrelas evoluem e como elementos (pesados) essenciais à nossa vida, como o ferro, são gerados e espalhados para o espaço interestelar.

No entanto, os anteriores observatórios de raios X tiveram sempre dificuldade em revelar a forma como a velocidade e a temperatura do plasma eram distribuídas. O XRISM também forneceu aspectos da misteriosa estrutura que rodeia um buraco negro supermassivo.

Apontando para a galáxia espiral NGC 4151, localizada a 62 milhões de anos-luz, as observações do XRISM oferecem uma visão sem precedentes do material muito próximo do buraco negro central da galáxia, que tem uma massa 30 milhões de vezes superior à do Sol. O XRISM captou a distribuição da matéria que circula e que eventualmente cai no buraco negro ao longo de um raio alargado, que vai de 0,001 a 0,1 anos-luz, ou seja, desde uma distância comparável à separação Sol-Úrano até 100 vezes essa distância.

Ao determinar os movimentos dos átomos de ferro a partir da sua assinatura de raios X, os cientistas mapearam uma sequência de estruturas em torno do buraco negro gigante: desde o disco que "alimenta" o buraco negro até ao toro em forma de rosquinha. 

Embora as observações de rádio e no infravermelho tenham revelado a presença de um toro em forma de rosquinha em volta de buracos negros em outras galáxias, a técnica espectroscópica do XRISM é a primeira, e atualmente a única, forma de descobrir como o gás perto do buraco negro central é formado e se move. 

As observações feitas com o XRISM complementarão as do telescópio de raios X XMM-Newton da ESA e constituirão uma excelente base para as observações planejadas com a futura missão de grande porte NewAthena da ESA. Esta última está sendo concebida para exceder significativamente o desempenho científico dos atuais observatórios de raios X espectroscópicos e de levantamento.

Fonte: Japan Aerospace Exploration Agency

quinta-feira, 19 de setembro de 2024

O remanescente da supernova da Nebulosa da Sereia

Novas estrelas nascem dos restos de estrelas mortas.

© Neil Corke (Nebulosa do Peixe Betta)

O remanescente gasoso do colapso gravitacional e subsequente morte de uma estrela muito massiva na Via Láctea criou o remanescente de supernova G296.5+10.0, do qual a Nebulosa da Sereia em destaque faz parte. Também conhecida como Nebulosa do Peixe Betta, a Nebulosa da Sereia faz parte de uma subclasse incomum de remanescentes de supernova que são de dois lados e quase circulares.

Originalmente descoberta em raios X, a nebulosa filamentosa é uma fonte frequentemente estudada também em luz de rádio e raios gama. A cor azul visível aqui se origina do oxigênio duplamente ionizado (OIII), enquanto o vermelho profundo é emitido pelo gás hidrogênio. O formato de sereia da nebulosa provou ser útil para medições do campo magnético interestelar.

Fonte: NASA

sábado, 24 de agosto de 2024

Rastreando uma estrela solitária que atravessa a Via Láctea

Pode parecer que o Sol está parado enquanto os planetas se movem à sua volta, mas na verdade o Sol está orbitando em torno do centro da nossa Galáxia, a Via Láctea, a uma impressionante velocidade de cerca de 220 quilômetros por segundo.

© Adam Makarenko (simulação da rápida velocidade de estrela)

Neste cenário, a subanã L pode ter sido parte de um sistema binário de anã branca que terminou com ela explodindo em uma supernova e ejetando a subanã L.

Por muito rápido que isso possa parecer, quando se descobriu uma tênue estrela vermelha que se movia ainda mais depressa no céu, a uma velocidade de cerca de 600 quilômetros por segundo, os cientistas ficaram atentos. Esta rara velocista estelar é a primeira estrela hiperveloz de massa muito baixa já encontrada, graças aos esforços de cientistas cidadãos e de uma equipe de astrônomos dos EUA utilizando vários telescópios, incluindo dois no arquipélago do Havaí, o Observatório W. M. Keck em Maunakea e o Pan-STARRS do Instituto de Astronomia da Universidade do Havaí, em Haleakalā, na ilha de Maui. 

Localizada a apenas 400 anos-luz da Terra, é a estrela hiperveloz mais próxima do Sol. Mais notavelmente, esta estrela pode estar numa trajetória incomum que poderá levá-la a deixar a Via Láctea. A estrela, designada por CWISE J124909+362116.0 (ou "J1249+36" para abreviar), foi detectada pela primeira vez por alguns dos mais de 80.000 cidadãos voluntários que participam no projeto Backyard Worlds: Planet 9, que passam a pente fino enormes quantidades de dados recolhidos nos últimos 14 anos pela missão WISE (Wide-field Infrared Survey Explorer) da NASA. Este projeto capitaliza a capacidade aguçada dos seres humanos, que estão evolutivamente programados para procurar padrões e detectar anomalias de uma forma que não é igualada pela tecnologia informática. 

Os voluntários marcam objetos em movimento em arquivos de dados e quando um número suficiente de voluntários marca o mesmo objeto, os astrônomos investigam. A J1249+36 destacou-se imediatamente porque se movia a cerca de 0,1% da velocidade da luz.

Para melhor compreender a natureza deste objeto, os astrônomos recorreram ao NIRES (Near-Infrared Echellette Spectrograph) do Observatório W. M. Keck e mediu o seu espectro infravermelho. Os dados revelaram que o objeto era uma subanã L, uma classe de estrelas com massas muito baixas e temperaturas mais baixas do que o nosso Sol. As subanãs representam as estrelas mais antigas da Via Láctea. 

Os dados espectrais, juntamente com os dados de imagem do Pan-STARRS e de vários outros telescópios terrestres, permitiram à equipe medir com precisão a posição e a velocidade de J1249+36 no espaço e assim prever a sua órbita através da Via Láctea. Os pesquisadores focaram-se em dois cenários possíveis para explicar a trajetória da J1249+36. No primeiro cenário, ela era originalmente a companheira de baixa massa de uma anã branca. As anãs brancas são os núcleos remanescentes de estrelas que esgotaram o seu combustível nuclear e se extinguiram. Quando uma companheira estelar está numa órbita muito próxima de uma anã branca, pode transferir massa, resultando em explosões periódicas chamadas novas. Se a anã branca acumular demasiada massa, pode entrar em colapso e explodir como uma supernova. Neste tipo de supernova, a anã branca é completamente destruída, pelo que a sua companheira é liberada e voa à velocidade orbital a que se movia originalmente, acrescida de um pequeno impulso da explosão da supernova.

No segundo cenário, J1249+36 era originalmente um membro de um aglomerado globular, um aglomerado de estrelas fortemente ligado, imediatamente reconhecível pela sua distinta forma esférica. Prevê-se que os centros destes aglomerados contenham buracos negros com uma grande variedade de massas. Estes buracos negros também podem formar binários, e tais sistemas acabam por ser grandes catapultas para quaisquer estrelas que se aproximem demasiado deles. Quando uma estrela encontra um buraco negro binário, a dinâmica complexa desta interação de três corpos pode atirar essa estrela para fora do aglomerado globular. 

Seguir J1249+36 para trás no tempo coloca-a numa parte muito povoada do céu, que pode esconder aglomerados ainda por descobrir. Para determinar se um destes cenários, ou algum outro mecanismo, pode explicar a trajetória de J1249+36, é necessário olhar mais de perto para a sua composição elementar. Por exemplo, quando uma anã branca explode, cria elementos pesados que podem ter "poluído" a atmosfera de J1249+36 quando esta estava escapando. As estrelas dos aglomerados globulares e das galáxias satélite da Via Láctea também têm padrões distintos de abundância de elementos que podem revelar a origem de J1249+36.

Os astrônomos estão essencialmente à procura de uma impressão digital química que permita identificar de que sistema vem esta estrela, cuja modelação permite medir as abundâncias de elementos de estrelas frias em vários aglomerados globulares. Quer a rápida viagem de J1249+36 se tenha devido a uma supernova, a um encontro casual com um buraco negro binário ou a qualquer outro cenário, a sua descoberta fornece uma nova oportunidade para os astrônomos aprenderem mais sobre a história e a dinâmica da Via Láctea.

Um artigo foi aceito para publicação no periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: W. M. Keck Observatory

terça-feira, 25 de junho de 2024

Sondando as origens da Nebulosa do Caranguejo

A Nebulosa do Caranguejo (Messier 1 ou M1) é um exemplo próximo dos detritos deixados para trás quando uma estrela sofre uma morte violenta numa explosão de supernova.

© Webb (M1)

No entanto, apesar de décadas de estudo, este remanescente de supernova continua mantendo um certo grau de mistério: que tipo de estrela foi responsável pela criação da Nebulosa do Caranguejo e qual foi a natureza da explosão? 

O telescópio espacial James Webb com os instrumentos MIRI (Mid-Infared Instrument) e NIRCam (Near-Infrared Camera) proporcionou uma nova visão de M1, incluindo os dados infravermelhos de maior qualidade já disponíveis para ajudar os cientistas a explorar a estrutura detalhada e a composição química do remanescente. Estas pistas estão ajudando a desvendar a forma incomum como a estrela explodiu há cerca de 1.000 anos. 

Os astrônomos analisaram a composição da Nebulosa do Caranguejo, um remanescente de supernova situado a 6.500 anos-luz de distância, na direção da constelação de Touro. A Nebulosa do Caranguejo é o resultado de uma supernova de colapso do núcleo, a morte de uma estrela massiva. A explosão de supernova foi observada na Terra no ano 1054 e foi suficientemente brilhante para ser vista durante o dia. O remanescente, muito mais tênue, observado hoje em dia, é uma concha em expansão de gás e poeira, e um vento alimentado por um pulsar, uma estrela de nêutrons de rotação rápida e altamente magnetizada.

A M1 possui composição atípica e a energia muito baixa da explosão levaram os astrônomos a pensar que se tratava de uma supernova de captura de elétrons, um tipo raro de explosão que surge de uma estrela com um núcleo menos evoluído feito de oxigênio, neônio e magnésio, em vez de um mais típico núcleo de ferro. Esforços de pesquisa anteriores calcularam a energia cinética total da explosão com base na quantidade e velocidades dos detritos atuais. Os astrónomos deduziram que a natureza da explosão foi de uma energia relativamente baixa (menos de um-décimo da de uma supernova normal) e que a massa da estrela progenitora se situava entre oito e 10 massas solares, oscilando na linha tênue entre as estrelas que sofrem uma morte violenta por supernova e as que não sofrem. 

No entanto, existem inconsistências entre a teoria da supernova por captura de elétrons e as observações da Nebulosa do Caranguejo, particularmente o rápido movimento observado do pulsar. Nos últimos anos, os astrônomos também melhoraram a sua compreensão das supernovas de colapso do núcleo de ferro e agora pensam que este tipo também pode produzir explosões de baixa energia, desde que a massa estelar seja adequadamente baixa.

Para reduzir o nível de incerteza acerca da estrela progenitora da Nebulosa do Caranguejo e da natureza da explosão, foram usadas as capacidades espectroscópicas do Webb para se focar em duas áreas localizadas nos filamentos interiores da nebulosa. As teorias preveem que, devido à diferente composição química do núcleo de uma supernova com captura de elétrons, a taxa da abundância de níquel em relação ao ferro (Ni/Fe) deve ser muito maior do que a taxa medida no nosso Sol (que contém estes elementos de gerações anteriores de estrelas). 

Estudos realizados no final da década de 1980 e início da década de 1990 mediram a taxa Ni/Fe na Nebulosa do Caranguejo usando dados ópticos e no infravermelho próximo e notaram uma taxa de abundância Ni/Fe elevada que parecia favorecer o cenário da supernova de captura de elétrons. Foi descoberto que a taxa ainda era elevada em comparação com o do Sol, mas apenas modestamente e muito mais baixo em comparação com estimativas anteriores. Os valores revistos são consistentes com a captura de elétrons, mas não excluem uma explosão de colapso do núcleo de ferro de uma estrela de massa similarmente baixa. 

Será necessário mais trabalho teórico e observacional para distinguir entre estas duas possibilidades. Para além de obter dados espectrais de duas pequenas regiões do interior da Nebulosa do Caranguejo a fim de medir a taxa de abundância, o telescópio também observou o ambiente mais amplo do remanescente para compreender os detalhes da emissão de síncrotron e a distribuição de poeira. As imagens e os dados recolhidos pelo MIRI permitiram à equipe isolar a emissão de poeira no interior da Nebulosa do Caranguejo e mapeá-la em alta resolução pela primeira vez. Ao mapear a emissão de poeira quente com o Webb, e até combinando-a com os dados do observatório espacial Herschel referente aos grãos de poeira mais frios, a equipe criou uma imagem completa da distribuição da poeira: os filamentos mais exteriores contêm poeira relativamente mais quente, enquanto os grãos mais frios estão predominantes perto do centro.

Estas conclusões foram aceitas para publicação no periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: Space Telescope Science Institute

terça-feira, 18 de junho de 2024

Aglomerados estelares próximos têm origem em apenas três "famílias"

Uma equipe internacional de astrônomos liderada pela Universidade de Viena decifrou a história da formação de jovens aglomerados de estrelas, alguns dos quais podemos ver a olho nu à noite.

© ESO / STScI (aglomerado estelar Alpha Persei)

Os pesquisadores relatam que a maioria dos aglomerados estelares jovens próximos pertencem apenas a três famílias, que têm origem em regiões de formação estelar muito massivas. Esta pesquisa também fornece novos conhecimentos sobre os efeitos das supernovas (explosões violentas no fim da vida de estrelas muito massivas) na formação de estruturas gigantes de gás em galáxias como a Via Láctea. 

Utilizando dados precisos da missão Gaia da ESA e observações espectroscópicas, foram rastreadas as origens de 155 aglomerados estelares jovens num raio de cerca de 3.500 anos-luz em torno do Sol. A análise mostra que estes aglomerados estelares podem ser divididos em três famílias com origens e condições de formação comuns. Estas três famílias de estrelas têm o nome dos seus aglomerados estelares mais proeminentes: Collinder 135 (Cr135), Messier 6 (M6) e Alpha Persei (α Per). 

O estudo concluiu que devem ter ocorrido mais de 200 explosões de supernova no seio destas três famílias de aglomerados estelares, liberando enormes quantidades de energia para o seu meio envolvente. Esta energia teve provavelmente um impacto significativo na distribuição do gás na Via Láctea local. Isto poderia explicar a formação de uma superbolha, uma bolha gigante de gás e poeira com um diâmetro de 3.000 anos-luz em torno da família Cr135. 

O nosso Sistema Solar também está inserido numa bolha deste tipo, a chamada Bolha Local, que está cheia de gás muito fino e quente. A Bolha Local está provavelmente também ligada à história de uma das três famílias de aglomerados estelares. E é provável que tenha deixado vestígios na Terra, como sugerem as medições de isótopos de ferro (60Fe) na crosta terrestre. 

No futuro, a equipe planeja investigar com mais precisão se e como o nosso Sistema Solar interagiu com a matéria interestelar na Via Láctea. 

Um artigo foi publicado na revista Nature

Fonte: University of Vienna