Um grupo de nove astrofísicos, sendo três deles brasileiros, produziu um mapa tridimensional da nebulosa de poeira que envolve a estrela Eta Carinae, uma das mais estudadas da Via Láctea.
© Hubble (Eta Carinae)
A nebulosa, conhecida como Homúnculo, foi criada por uma grande erupção na Eta Carinae em 1843 e vem se expandindo desde então. O Homúnculo tem a forma de dois lóbulos, constituídos de uma casca fina de poeira com cerca de 15 vezes a massa do Sol e 3 trilhões de quilômetros de extensão. O sistema binário de estrelas fica no encontro desses dois lóbulos.
Além da forma bipolar, já conhecida, o trabalho mostra uma série de protuberâncias (protrusions), depressões (trenches), buracos (holes) e desvio da simetria axial. Isto só foi conseguido até agora para raríssimos corpos celestes fora do Sistema Solar.
“É admirável que a nebulosa tenha guardado marcas tão claras da interação que teve o sistema binário, quando ela era um milésimo do tamanho atual”, explicou Augusto Damineli, professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP e um dos nove autores do artigo. Damineli estuda a Eta Carinae há mais de 20 anos e foi um dos primeiros a afirmar que ela se tratava, na verdade, de um sistema de duas estrelas. Também investigou o fenômeno de eclipse do sistema, que ocorre a cada cinco anos e produz efeito de “apagamento” na estrela de alta energia.
A Eta Carinae, (na constelação da Quilha, ou “Carina”, em latim), está a 7.500 anos-luz da Terra. A estrela é mais visível e observada a partir do Hemisfério Sul, mas ainda existe visibilidade em baixas latitudes no Hemisfério Norte. De tamanho muito grande (segundo a estimativa mais alta seu raio pode medir 0,9 unidades astronômicas), seu aspecto mais marcante é a variação de seu brilho em várias ordens de magnitude.
Trata-se de um marco técnico e o resultado é relevante para se estudar a dinâmica de formação dessa nebulosa. A maioria dessas estruturas está ligada diretamente ao sistema de estrelas duplas localizado no coração do Homúnculo. As marcas formam uma espécie de “impressão digital” do nascimento da nebulosa. A nuvem de gás e poeira, ao ser ejetada pela estrela principal do par binário, interagiu com o material que estava acumulado no plano orbital do sistema, deixando marcas nele.
Para realizar o mapeamento, foram utilizados dados obtidos com o espectrógrafo X-SHOOTER, montado no telescópio VLT do ESO. Os dados foram então tratados com o software SHAPE.
Com o mapa tridimensional, foi possível verificar que os dois lóbulos do Homúnculo não são idênticos e não estão perfeitamente alinhados. Encontrou-se, no entanto, um buraco principal polar em cada lóbulo, com alinhamento com o eixo orbital do sistema. Além disso, a depressão no lóbulo mais próximo à Terra é simétrica à depressão encontrada no lóbulo oposto. Outro detalhe descoberto no mapeamento foram protuberâncias saindo da região da “cintura” do Homúnculo. Cada lóbulo apresenta uma protuberância, como uma imagem espelhada da outra.
A pesquisa tem como primeiro autor Wolfgang Steffen, pesquisador da UNAM (México) e desenvolvedor do software SHAPE, utilizado na modelagem do Homúnculo. Mairan Teodoro, o segundo autor do artigo, é doutor em Astronomia pelo IAG-USP e está realizando seu pós-doutorado no Goddard Space Flight Center da NASA. O outro brasileiro que assina o trabalho é Jose Henrique Groh, também doutor em Astronomia pelo IAG e, atualmente, pesquisador no Observatório de Genebra, Suíça.
© Goddard Space Flight Center (modelo do objeto celeste obtido em impressora laser 3D)
O astrônomo Augusto Damineli disponibiliza uma página na internet com explicações detalhadas sobre o mapa 3D do Homúnculo e o artigo do trabalho.
O material está disponível em http://www.etacarinae.iag.usp.br/pressrelease.html. Nessa página também estão os links para que você possa baixar um arquivo e mandá-lo a uma impressora laser 3D (acrílico ou plástico), obtendo assim um modelo material desse objeto celeste.
O trabalho foi publicado em 8 de julho de 2014 no periódico científico Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.
Fonte: IAG/USP
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