A equipe, liderada por Roland Bacon da Universidade de Lyon (CRAL, CNRS), na França, utilizou o instrumento MUSE (Multi Unit Spectroscopic Explorer) para observar o HUDF (Hubble Ultra Deep Field), uma região do céu na constelação austral da Fornalha bastante estudada.
© ESO/MUSE (Hubble Ultra Deep Field)
Obtiveram-se assim as observações espectroscópicas mais profundas até hoje; foram medidas informações espectroscópicas precisas para 1.600 galáxias muito fracas, o que corresponde a dez vezes o número de galáxias que se tinham conseguido medir neste campo durante a última década, com telescópios situados no solo.
As imagens HUDF originais, publicadas em 2004, são observações de campo profundo obtidas com o telescópio espacial Hubble da NASA/ESA. Eram as mais profundas obtidas até então e revelaram uma enorme quantidade de galáxias, observadas quando o Universo tinha menos de um bilhão de anos. A região foi subsequentemente observada muitas vezes, tanto com o Hubble como com outros telescópios, resultando na imagem mais profunda do Universo obtida até então. Agora, e apesar da profundidade das observações Hubble, o MUSE conseguiu revelar 72 galáxias nunca antes observadas nesta minúscula área do céu.
Roland Bacon explica melhor: ”O MUSE consegue fazer algo que o Hubble não é capaz, ou seja, separa a luz vinda de cada ponto da imagem nas suas componentes de cor, criando um espectro. Isso permite medir distâncias, cores e outras propriedades de todas as galáxias que observamos, incluindo algumas invisíveis ao próprio Hubble!”
Os dados MUSE dão uma nova visão de galáxias muitos distantes e fracas, observadas próximo do início do Universo, há cerca de 13 bilhões de anos atrás. Este instrumento detectou galáxias 100 vezes mais fracas do que os rastreios anteriores, acrescentando assim a um campo observado já muito rico e aprofundando o nosso conhecimento das galáxias ao longo dos tempos.
O rastreio descobriu 72 candidatas a galáxias do tipo Lyman-alfa, objetos que emitem apenas em radiação Lyman-alfa. Os elétrons carregados negativamente que orbitam os núcleos carregados positivamente de um átomo, têm níveis de energia quantificados. Isto significa que apenas podem existir em estados de energia específicos e apenas podem transitar entre estes estados ganhando ou perdendo quantidades precisas de energia. A radiação de Lyman-alfa é produzida quando elétrons nos átomos de hidrogênio decaem do segundo nível de energia mais baixa para o primeiro nível de energia mais baixa. Esta quantidade de energia precisa que se perde, é liberada sob a forma de radiação com um comprimento de onda particular na região ultravioleta do espectro eletromagnético, a qual é detectada pelos astrônomos com telescópios no espaço, ou no solo, no caso de se tratarem de objetos que apresentam desvios para o vermelho. Para estes dados, com desvios para o vermelho entre 3 e 6,6, a radiação de Lyman-alfa é observada na luz visível ou infravermelha próxima.
A nossa compreensão atual da formação estelar não explica completamente este tipo de galáxias, que parecem apenas brilhar intensamente nesta cor. Uma vez que o MUSE dispersa a luz nas suas componentes de cor, estes objetos tornam-se aparentes, mas permanecem invisíveis em imagens diretas profundas, como é o caso das do Hubble.
“O MUSE tem a capacidade única de extrair informação sobre algumas das galáxias mais precoces do Universo, mesmo numa região do céu já tão bem estudada,” explica Jarle Brinchmann, da Universidade de Leiden, na Holanda, e do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço, Porto, Portugal. “Usando espectroscopia podemos aprender mais sobre estas galáxias, tais como o seu conteúdo químico e movimentos internos, não para cada galáxia de cada vez, mas para todas as galáxias ao mesmo tempo!”
Outro resultado importante deste estudo foi a detecção sistemática de halos de hidrogênio luminoso em torno de galáxias do Universo primordial, o que dá aos astrônomos uma nova maneira promissora de estudar como é que o material flui para dentro e para fora das galáxias primitivas.
Numa série de artigos científicos são exploradas muitas outras aplicações potenciais desta base de dados, incluindo o papel de galáxias tênues durante a reionização cósmica (que começou apenas 380 mil anos após o Big Bang), taxas de fusão de galáxias quando o Universo era jovem, ventos galáticos, formação estelar e mapeamento dos movimentos das estrelas no Universo primordial.
“Notavelmente, estes dados foram todos obtidos sem o uso do recente melhoramento do MUSE relativo à Infraestrutura de óptica adaptativa. A ativação desta infraestrutura, após uma década de trabalho intenso por parte dos astrônomos e engenheiros do ESO, promete dados ainda mais revolucionários no futuro,” conclui Roland Bacon.
A Infraestrutura de óptica adaptativa com o MUSE revelou já anéis em torno da nebulosa planetária IC 4406, estruturas nunca antes observadas.
Este trabalho foi descrito numa série de 10 artigos científicos que estão sendo publicados num número especial da revista especializada Astronomy & Astrophysics.
Fonte: ESO
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