segunda-feira, 31 de agosto de 2020

Plano para atenuar os efeitos das constelações de satélites na astronomia

Acaba de ser apresentado, por uma equipe internacional de especialistas, incluindo pesquisadores do ESO, um novo relatório que explora medidas práticas para combater o impacto das grandes constelações de satélites na astronomia.

© ESO/B. Tafreshi (Via Láctea vista do deserto do Atacama)

O relatório conclui que as grandes constelações de satélites brilhantes colocadas em órbitas terrestres baixas irão alterar de forma fundamental a astronomia óptica e infravermelha realizada a partir do solo, podendo igualmente ter um impacto importante na aparência do céu noturno para os observadores de todo mundo. Este relatório fornece também um plano de ação a ser trabalhado em conjunto entre observatórios e operadores de satélites de forma a atenuar estes impactos.

O relatório apresenta dois resultados principais. Primeiro, os satélites em órbitas terrestres baixas afetam de forma desproporcional os programas científicos que dependem de observações feitas durante o crepúspulo, tais como a procura de asteroides que possam ameaçar a Terra ou de contrapartes visíveis transitórias de fontes de ondas gravitacionais. Os satélites que orbitam abaixo dos 600 km de altitude interferem de forma limitada nas observações astronômicas executadas durante as horas mais escuras da noite. No entanto, os satélites colocados a altitudes mais altas, tais como a constelação planejada pela OneWeb para 1.200 km de altitude, podem estar iluminados toda a noite durante o verão e grande parte da noite nas outras estações. Estas constelações poderão ter sérias consequências negativas em muitos programas de pesquisa nos principais observatórios ópticos do mundo. Dependendo da sua altitude e brilho, as constelações de satélites poderão ainda afetar a visão do céu estrelado dos astrofotógrafos, astrônomos amadores e outros entusiastas da natureza.

Segundo, o relatório oferece várias maneiras de mitigar os danos causados à astronomia por grandes constelações de satélites: os operadores poderiam lançar menos satélites, colocá-los a altitudes abaixo dos 600 km, escurecer as sondas espaciais, ou usar guarda-sóis que façam sombra nas superfícies refletoras, e controlar a altitude de cada satélite para que este reflita menos luz solar para a Terra. A comunidade astronômica, por outro lado, poderia contribuir para estes esforços de mitigação ajudando os operadores a identificar limites mais baixos para o brilho dos satélites e calculando quão efetivos poderão ser os diferentes modos de diminuir o brilho destes objetos. O relatório recomenda ainda que os observatórios apoiem o desenvolvimento de ferramentas que removam ou mascarem os rastros dos satélites e os seus efeitos nas imagens astronômicas e que calculem as trajetórias dos satélites, evitando-se assim os seus rastros. O ESO, juntamente com outros observatórios, está avaliando os custos desses esforços de mitigação.

O relatório é o resultado do workshop virtual SATCON1, organizado pelo NOIRLab, um centro de astronomia da Fundação Nacional de Ciência dos Estados Unidos da América e da Sociedade Astronômica Americana. De 29 de junho a 2 de julho, o workshop reuniu mais de 250 cientistas, engenheiros e operadores de satélites, que debateram os impactos das mega-constelações e exploraram várias maneiras de os mitigar. Os especialistas do ESO Olivier Hainaut, Andrew Williams e Angel Otarola estavam entre os participantes do workshop e são os autores do novo relatório.

No início deste ano, e após as preocupações levantadas pela comunidade astronômica de como é que as constelações de satélites iriam afetar a pesquisa científica, o ESO divulgou um estudo, de Hainaut e Williams, sobre este impacto, concentrando-se principalmente em observações com telescópios do ESO no visível e infravermelho. Foram consideradas um total de 18 constelações de satélites representativas, em desenvolvimento pela SpaceX, Amazon e OneWeb, entre outros, e chegou-se à conclusão que os grandes telescópios, tais como o Very Large Telescope (VLT) do ESO e o futuro Extremely Large Telescope (ELT) do ESO seriam "moderadamente afetados" por estas constelações. O estudo, que também explorou os impactos em instalações não pertencentes ao ESO, descobriu que o maior impacto poderia ser em levantamentos de campo amplo, em particular aqueles feitos com grandes telescópios, como o Observatório Vera C. Rubin do NOIRLab.

O telescópio VISTA do ESO foi utilizado para observar os satélites Starlink, ajudando assim às simulações. Dispor de simulações detalhadas de constelações de satélites é importante pois permite, no futuro, efetuar rapidamente cálculos de impacto, ajudando a criar ferramentas para que os operadores de telescópio possam marcar as observações de modo a evitar os rastros dos satélites. O reagendamento de observações para além de não evitar todos os impactos, apoia-se em informações precisas dadas pelas companhias de satélites, no entanto poderá minimizar os efeitos.

O ESO continuará trabalhando ativamente com a comunidade astronômica internacional no sentido de compreender melhor os impactos das grandes constelações de satélites e desenvolver soluções em parceria com a indústria e as agências governamentais. O SATCON2, que abordará as questões significativas de política e regulamentação, está provisoriamente planejado para o início de meados de 2021.

Fonte: ESO

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