sábado, 20 de dezembro de 2025

O que está alimentando estes brilhantes clarões azuis?

Entre os fenômenos cósmicos mais intrigantes descobertos nas últimas décadas encontram-se breves e muito brilhantes clarões de luz azul e ultravioleta que desvanecem gradualmente, deixando para trás tênues emissões de raios X e rádio.

© UC Berkeley (AT 2024wpp)

Com pouco mais de uma dúzia de surtos descobertos até agora, os astrônomos têm debatido se estes são produzidos por um tipo incomum de supernova ou por gás interestelar que cai num buraco negro.

A análise do surto mais brilhante até à data, descoberto no ano passado, mostra que não se trata de nenhuma destas situações. Em vez disso, uma equipe de astrônomos liderada por pesquisadores da Universidade da Califórnia, em Berkeley, concluiu que estes chamados LFBOTs (Luminous Fast Blue Optical Transients) são causados por um evento de perturbação de marés extremo, em que um buraco negro com uma massa até 100 vezes superior à do nosso Sol destrói completamente a sua estrela massiva companheira em poucos dias.

A descoberta resolve um enigma de uma década, mas também ilustra as muitas variedades de calamidades estelares que os astrônomos encontram, cada uma com o seu espectro característico de luz, ou seja, diferentes comprimentos de onda e diferentes intensidades, que evolui ao longo do tempo. A descoberta dos processos que produzem estas assinaturas de luz únicas testa os conhecimentos atuais sobre a física dos buracos negros e ajuda a compreender a evolução das estrelas no nosso Universo.

A massa inferida do buraco negro, numa gama por vezes designada por buracos negros de massa intermediária, é também intrigante. Embora se saiba que existem buracos negros com mais de 100 massas solares, porque as suas fusões foram detectadas por experiências de ondas gravitacionais como o LIGO (Laser Interferometer Gravitational-Wave Observatory), nunca foram observados diretamente e a forma como atingem esta dimensão é ainda um mistério. O estudo deste fenômeno e de outros semelhantes poderá esclarecer o ambiente estelar em que os grandes buracos negros evoluem juntamente com uma companheira estelar massiva.

Os LFBOTs receberam este nome porque são brilhantes, são visíveis a distâncias de centenas de milhões a bilhões de anos-luz, e duram apenas alguns dias, produzindo luz altamente energética que vai desde o azul do espectro óptico até ao ultravioleta e aos raios X.

O primeiro foi visto em 2014, mas o primeiro com dados suficientes para análise foi registado em 2018 e, de acordo com a convenção de nomenclatura padrão, foi chamado AT2018cow. O nome levou os pesquisadores a referirem-se a ele como "A Vaca", e os LFBOTs subsequentes receberam as alcunhas de "O Coala" (ZTF18abvkwla), "Diabo da Tasmânia" (AT2022tsd) e "O Finch" (AT2023fhn). O mais recente LFBOT foi denominado AT 2024wpp ("O Pica-pau", talvez?). 

A constatação de que o surto transiente não poderia ter resultado de uma supernova veio depois de os pesquisadores terem calculado a energia emitida, que foi 100 vezes superior à que seria produzida numa supernova normal, que exigiria a conversão de cerca de 10% da massa restante da estrela em energia numa escala de tempo muito curta, meras semanas.

Os pesquisadores colocam a hipótese de que a luz intensa e altamente energética emitida durante este evento de perturbação de marés extremo foi uma consequência da longa história parasitária do sistema binário com buraco negro. De acordo com a reconstrução desta história, o buraco negro tem estado sugando material da sua companheira há muito tempo, envolvendo-se completamente num halo de material muito distante do buraco negro para este poder engolir. Então, quando a estrela companheira finalmente se aproximou demasiado e foi despedaçada, o novo material foi arrastado para um disco giratório de detritos, chamado disco de acreção, e bateu contra o material existente, gerando raios X, radiação UV e luz azul.

Grande parte do gás da companheira também acabou por rodopiar em direção aos polos do buraco negro, onde foi ejetado como um jato de material. Os pesquisadores calcularam que os jatos viajavam a cerca de 40% da velocidade da luz e geravam ondas de rádio quando encontravam o gás circundante. A massa estimada da estrela companheira que foi destruída era mais de 10 vezes superior à massa do Sol. Pode ter sido o que é conhecido como uma estrela Wolf-Rayet, que são muito quentes e evoluídas, tendo já usado muito do seu hidrogênio. Isto explicaria a fraca emissão de hidrogênio de AT 2024wpp.

Como a maioria dos LFBOTs, AT 2024wpp está localizado numa galáxia com formação estelar ativa, pelo que são esperadas estrelas grandes e jovens como estas. AT 2024wpp está a 1,1 bilhões de anos-luz de distância e é entre cinco e 10 vezes mais luminosa do que AT2018cow.

Foi utilizada uma grande coleção de telescópios para medir os vários comprimentos de onda da luz emitida pelo LFBOT. Estes incluem três telescópios de raios X, o Chandra, o Swift e o NuSTAR; radiotelescópios como o ALMA e o ATCA (Australia Telescope Compact Array); e telescópios ópticos terrestres, incluindo os Observatórios Keck, Lick e Gemini. Uma vez que os LFBOTs produzem grandes quantidades de radiação UV, aguarda-se com expectativa o lançamento de dois telescópios UV planejados, ULTRASAT e UVEX, nos próximos anos. Estes telescópios serão fundamentais para descobrir e caracterizar rapidamente mais LFBOTs antes de atingirem o pico de brilho, permitindo aos astrônomos sondar sistematicamente a diversidade dos seus ambientes e sistemas progenitores.

Um artigo foi publicado no periódico The Astrophysical Journal Letters.

Fonte: University of California