sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

Mapeamento de "ecos de luz" de buraco negro recém-descoberto

Cientistas mapearam o ambiente em torno de um buraco negro de massa estelar com 10 vezes a massa do Sol usando o NICER (Neutron star Interior Composition Explorer) da NASA a bordo da Estação Espacial Internacional (ISS).


© Goddard Space Flight Center (buraco negro atraindo matéria de uma estrela companheira)

O NICER detectou raios X do recém-descoberto buraco negro MAXI J1820+070 (ou J1820), à medida que consumia material de uma estrela companheira. Ondas de raios X formaram "ecos de luz" refletidos do turbilhão de gás perto do buraco negro e revelaram mudanças no tamanho e na forma do ambiente.

Anteriormente, estes ecos de luz do disco interior de acreção tinham sido vistos apenas em buracos negros supermassivos, que têm milhões a bilhões de vezes a massa do Sol e que mudam muito lentamente. Os buracos negros de massa estelar como J1820 têm massas muito menores e evoluem muito mais depressa, de modo que possibilita observar mudanças ocorrendo em escalas de tempo humanas.

O J1820 está localizado a aproximadamente 10.000 anos-luz na direção da constelação de Leão. A estrela companheira no sistema foi identificada num levantamento realizado pela missão Gaia da ESA, que permitiu a estimativa de sua distância. Os astrônomos só souberam da presença do buraco negro no dia 11 de março de 2018, quando foi detectada uma explosão pelo MAXI (Monitor of All-sky X-ray Image) da JAXA, também a bordo da ISS. O J1820 passou de um buraco negro totalmente desconhecido para uma das fontes mais brilhantes do céu de raios X ao longo de alguns dias. O NICER foi rapidamente apontado para esta transição dramática e continua seguindo o rescaldo da erupção.

Um buraco negro pode sugar gás de uma estrela companheira próxima para um anel de material chamado disco de acreção. As forças gravitacionais e magnéticas aquecem o disco a milhões de graus, tornando-o quente o suficiente para produzir raios X nas regiões mais internas do disco, perto do buraco negro. As explosões ocorrem quando uma instabilidade no disco provoca uma inundação de gás para o interior, na direção do buraco negro, como uma avalanche. Os motivos das instabilidades de disco não são bem compreendidos.

Acima do disco está a coroa, uma região de partículas subatômicas com mais ou menos um bilhão de graus Celsius que brilha em raios X altamente energéticos. Ainda permanecem muitos mistérios sobre a origem e evolução da coroa. Algumas teorias sugerem que a estrutura poderá representar uma forma inicial dos jatos de partículas velozes que estes tipos de sistemas geralmente emitem.

Os astrofísicos querem entender melhor como a orla interna do disco de acreção e a coroa, por cima, mudam de tamanho e forma à medida que um buraco negro acreta material da sua estrela companheira. Se se conseguir entender como e porque é que estas mudanças ocorrem nos buracos negros de massa estelar ao longo de um período de semanas, os cientistas podem elucidar detalhes sobre a evolução dos buracos negros supermassivos ao longo de milhões de anos e como afetam as galáxias em que residem.

Um dos métodos usados para estudar estas mudanças tem o nome mapeamento de reverberação de raios X, que usa reflexos de raios X da mesma maneira que um sonar usa ondas sonoras para mapear terreno submarino. Alguns raios X da coroa viajam diretamente até nós, enquanto outros iluminam o disco e são refletidos de volta em energias e ângulos diferentes.

O mapeamento de reverberação de raios X dos buracos negros supermassivos mostrou que a orla interna do disco de acreção está muito próxima do horizonte de eventos, o ponto de não retorno. A coroa também é compacta, ficando mais próxima do buraco negro do que grande parte do disco de acreção. Observações anteriores de ecos de raios X de buracos negros estelares, no entanto, sugeriram que a seção interior do disco de acreção podia estar bem distante, até centenas de vezes o tamanho do horizonte de eventos. No entanto, o buraco negro de massa estelar J1820 tem um comportamento mais parecido com o dos seus primos supermassivos.

Durante as observações do J1820 pelo NICER, foi vista uma diminuição no atraso de tempo entre o clarão inicial de raios X oriundos diretamente da coroa e o seu eco do disco, indicando que os raios X viajaram cada vez menos antes de serem refletidos. A 10.000 anos-luz de distância, foi estimado que a coroa se contraiu verticalmente de aproximadamente 161 km para 16,1 km.

Para confirmar que a diminuição no tempo de atraso era provocada por uma mudança na coroa e não no disco, os cientistas usaram um sinal chamado linha K de ferro, produzido quando os raios X da coroa colidem com átomos de ferro no disco, dotando-os de fluorescência. O tempo corre mais devagar em campos gravitacionais mais fortes e a velocidades mais altas, como indicado pela teoria da relatividade de Einstein. Quando os átomos de ferro mais próximos do buraco negro são bombardeados pela luz do núcleo da coroa, os comprimentos de onda de raios X que emitem são esticados porque o tempo move-se mais lentamente para eles do que para o observador (neste caso, o NICER).

A equipe descobriu que a linha K de ferro esticada do J1820 permaneceu constante, o que significa que a orla interna do disco permaneceu perto do buraco negro, semelhante a um buraco negro supermassivo. Se o menor tempo de atraso fosse provocado por uma região interna do disco movendo-se ainda mais para dentro, então a linha K de ferro teria sido esticada ainda mais.

Estas observações fornecem aos cientistas novas informações sobre como o material é afunilado para o buraco negro e como a energia é liberada neste processo.

O artigo que descreve as descobertas foi publicado na revista Nature.

Fonte: Massachusetts Institute of Technology

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