Um planeta descoberto o ano passado, situado a uma distância invulgarmente grande da sua estrela - 16 vezes mais distante que Plutão do Sol - pode ter sido expulso do seu local de nascimento, mais perto da estrela, num processo parecido ao que pode ter ocorrido no início da história do nosso próprio Sistema Solar.
© UC Berkeley/Paul Kalas (estrela HD 106906 e o seu exoplaneta)
A imagem acima de grande angular mostra a estrela HD 106906 obtida com o telescópio espacial Hubble e uma ampliação pelo GPI que revela um sistema dinamicamente perturbado de cometas, sugerindo uma ligação com o distante exoplaneta (para cima, à direita).
As imagens do GPI (Gemini Planet Imager) nos Andes Chilenos e do telescópio espacial Hubble mostram que a estrela tem um cinturão assimétrico de cometas, indicativa de um sistema muito perturbado e sugere que as interações planetárias que agitaram os cometas para mais perto da estrela podem ter enviado o exoplaneta também para o exílio. O exoplaneta pode até ter arrastado com ele o seu próprio anel de detritos.
"Nós pensamos que o planeta, propriamente dito, pode ter capturado material do cinturão cometário e que o planeta está rodeado por um grande anel de poeira ou por um manto de poeira," afirma Paul Kalas, professor adjunto de astronomia da Universidade da Califórnia em Berkeley, EUA. "Fizemos três testes e encontramos evidências de uma nuvem de poeira, mas ainda sem grandes certezas."
"As medições que fizemos sobre o planeta sugerem que pode ser mais empoeirado, comparativamente, do que outros objetos, e estamos fazendo observações de acompanhamento para verificar se o planeta está realmente cercado por um disco, uma possibilidade empolgante," acrescenta Abhi Rajan, aluno da Universidade Estatal do Arizona, que analisou as imagens do planeta.
Estes exoplanetas são de interesse porque, na sua juventude, o nosso próprio Sistema Solar pode ter tido planetas que foram expulsos da sua vizinhança local e que já não estão entre os oito planetas que vemos hoje.
"Será que é uma imagem do nosso Sistema Solar, quando tinha apenas 13 milhões de anos?" questiona Kalas. "Nós sabemos que a nossa própria nuvem de cometas, o Cinturão de Kuiper, perdeu uma grande fração da sua massa enquanto evoluía, mas não temos uma máquina do tempo para voltar atrás e ver como foi dizimada. Uma das maneiras, porém, é estudar estes episódios violentos de perturbações gravitacionais em torno de outras estrelas jovens que chutam para fora muitos objetos, incluindo planetas."
O distúrbio pode ter sido provocado por uma estrela que passou por perto, que acabou por perturbar os planetas interiores, ou um por um segundo planeta massivo no sistema. A equipe GPI procurou outro planeta grande mais perto da estrela, que pode ter interagido com o exoplaneta, mas não encontrou nada para além de uma órbita com o tamanho da de Urano.
A estrela, HD 106906, está localizada a 300 anos-luz de distância na direção da constelação de Cruzeiro do Sul e é parecida com o Sol, mas muito mais jovem: tem cerca de 13 milhões de anos, em comparação com os 4,5 bilhões de anos da nossa estrela. No entanto, pensa-se que os planetas se formam no início da história de uma estrela, e em 2014 uma equipe liderada por Vanessa Bailey da Universidade do Arizona descobriu o planeta HD 106906 b ao redor de uma estrela, planeta este que tem 11 vezes a massa de Júpiter e está localizado nos subúrbios distantes da estrela, à incrível distância de 650 UA da estrela (uma UA, ou unidade astronômica, é a distância média da Terra ao Sol, cerca de 150 milhões de quilômetros).
Pensa-se que os planetas não se formam tão longe da sua estrela e do seu disco protoplanetário, por isso é provável que o planeta se formou como uma estrela, através da acreção da sua própria nuvem de gás e poeira. As descobertas do GPI e do Hubble, de um cinturão cometário altamente assimétrico e de um possível anel em torno do planeta, apontam, ao invés, para uma formação normal dentro do disco de detritos em torno da estrela, mas que um episódio violento o empurrou para uma órbita mais distante.
Os astrônomos, usando o GPI, tiveram em maio de 2015 como primeiro alvo a estrela, em busca de outros planetas, e descobriram que estava rodeada por um anel de material poeirento com aproximadamente o tamanho do Cinturão de Kuiper do nosso próprio Sistema Solar. O vazio da região central, uma área com aproximadamente 50 UA de raio, um pouco maior que a região ocupada pelos planetas no nosso próprio Sistema Solar, indica a formação de um sistema planetário.
Kalas imediatamente reanalisou imagens existentes da estrela, obtidas anteriormente pelo telescópio espacial Hubble, e descobriu que o anel de material poeirento estendia-se para muito mais longe e que era altamente desigual. No lado voltado para o planeta, o material empoeirado era verticalmente fino e abrangia quase por completo a enorme distância até ao planeta conhecido, mas no lado oposto o material era verticalmente espesso e truncado.
"Estas descobertas sugerem que todo o sistema planetário foi recentemente perturbado por algo ainda desconhecido e deu origem à sua assimetria atual," diz. O planeta também é invulgar referente à sua órbita, pois está inclinada 21 graus em relação ao plano do sistema planetário interior, enquanto a maioria dos planetas normalmente encontram-se perto de um plano comum.
Kalas e seus colaboradores teorizam que o planeta pode ter sido formado bem mais perto do cinturão cometário e pode ter capturado material que ainda o orbita. Para testar esta hipótese, analisaram cuidadosamente as observações do GPI e do Hubble, revelando três propriedades acerca do planeta consistentes com um grande anel de poeira ou com um manto em seu redor. No entanto, para cada das três propriedades, explicações alternativas são possíveis.
Os pesquisadores vão fazer observações mais sensíveis com o telescópio espacial Hubble a fim de determinarem se HD 106906 b é, de fato, um dos primeiros exoplanetas que se parece com Saturno e com o seu sistema de anéis.
O cinturão interior de poeira em torno da estrela foi confirmado por uma equipe independente usando o instrumento SPHERE no VLT do ESO. A natureza assimétrica do disco de detritos, no entanto, não era evidente, até que Kalas usou imagens de arquivo do instrumento ACS (Advanced Camera for Surveys) do Hubble.
O levantamento exoplanetário do GPI, operado por uma equipe de astrônomos de 24 instituições, tem como alvo 600 estrelas jovens, todas com menos de 100 milhões de anos, a fim de compreender como é que os sistemas planetários evoluem ao longo do tempo e que dinâmicas planetárias podem dar forma aos arranjos finais de planetas como o que vemos no Sistema Solar hoje. O GPI opera no telescópio Gemini Sul e fornece imagens diretas de alto contraste e de alta resolução, espectroscopia de campo integral e polarimetria de exoplanetas.
Fonte: UC Berkeley
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