domingo, 16 de janeiro de 2022

Um exoplaneta com formato de bola de rugby

A missão exoplanetária Cheops da ESA revelou que um exoplaneta que orbita a sua estrela hospedeira em menos de um dia tem uma forma mais parecida à de uma bola de rugby do que de uma esfera.

© ESA (ilustração do exoplaneta WASP-103b e da sua estrela hospedeira)

Esta é a primeira vez que se detecta deformação num exoplaneta, fornecendo novas informações sobre a estrutura interna destes planetas que orbitam as suas estrelas. 

O planeta, conhecido como WASP-103b, está localizado na direção da constelação de Hércules. Foi deformado pelas fortes forças de maré entre o planeta e a sua estrela progenitora WASP-103, que é cerca de 200 graus mais quente e 1,7 vezes maior do que o Sol. 

Os oceanos da Terra têm marés principalmente devido a um ligeiro puxão da Lua. O Sol também tem um efeito menor, mas significativo, sobre as marés, contudo está demasiado longe da Terra para provocar grandes deformações no nosso planeta. O mesmo não pode ser dito de WASP-103b, um planeta com quase o dobro do tamanho de Júpiter, com 1,5 vezes a sua massa, que orbita a sua estrela hospedeira em menos de um dia. 

Os astrônomos já suspeitavam que uma proximidade tão íntima provocaria marés monumentais, mas até agora não tinham sido capazes de as medir. Utilizando novos dados do telescópio espacial Cheops da ESA, combinados com dados que já tinham sido obtidos pelo telescópio espacial Hubble e pelo telescópio espacial Spitzer da NASA, os astrônomos conseguiram agora detectar como as forças das marés deformam o exoplaneta WASP-103b de uma esfera normal para uma forma mais parecida à de uma bola de rugby. 

O Cheops mede trânsitos exoplanetários, ou seja, a queda na luz provocada quando um planeta passa em frente da sua estrela, a partir do nosso ponto de vista. Normalmente, o estudo da forma da curva de luz irá revelar detalhes sobre o planeta, tais como o seu tamanho. A alta precisão do Cheops, juntamente com a sua flexibilidade de apontamento, que permite com que o satélite regresse a um alvo e observe múltiplos trânsitos, permitiu a detecção do minúsculo sinal da deformação de maré de WASP-103b. Esta assinatura distinta pode ser utilizada para desvendar ainda mais informações sobre o planeta.

A equipe foi capaz de usar a curva de luz do trânsito de WASP-103b para derivar um parâmetro - os números de Love - que medem a forma como a massa é distribuída dentro de um planeta. A compreensão de como a massa é distribuída pode revelar detalhes sobre a estrutura interna do planeta. A resistência de um material a ser deformado depende da sua composição. Por exemplo, aqui na Terra temos marés devido à Lua e ao Sol, mas só podemos ver marés nos oceanos. A parte rochosa não se move assim tanto. Ao medir quanto o planeta é deformado, podemos dizer que porcentagem é rochosa, gasosa ou água.

Os números de Love para WASP-103b são semelhantes aos de Júpiter, o que sugere provisoriamente que a estrutura interna é idêntica, apesar de WASP-103b ter o dobro do raio. Em princípio, esperava-se que um planeta com 1,5 vezes a massa de Júpiter tivesse aproximadamente o mesmo tamanho, por isso WASP-103b deve estar muito inflado devido ao aquecimento da sua estrela e talvez devido a outros mecanismos. 

Uma vez que a incerteza nos números de Love ainda é bastante elevada, serão necessárias observações futuras com o Cheops e com o telescópio espacial James Webb para decifrar os detalhes. A precisão extremamente alta do Webb irá melhorar as medições da deformação das marés exoplanetárias, permitindo uma melhor comparação entre estes chamados "Júpiteres quentes" e os planetas gigantes no Sistema Solar. 

O WASP-103b também tem outro mistério. As interações de maré entre uma estrela e um planeta do tamanho de Júpiter, muito próximo, fariam com que o período orbital do planeta fosse encurtado, aproximando-o gradualmente da estrela antes de ser eventualmente engolido por sua estrela. No entanto, as medições de WASP-103b parecem indicar que o período orbital pode estar aumentando e que o planeta está a se afastando lentamente da estrela. Isto indicaria que algo, para além das forças de maré, é o fator dominante que afeta este planeta. 

Os astrônomos analisaram outros potenciais cenários, tais como uma estrela companheira da hospedeira afetando a dinâmica do sistema, ou a órbita do planeta ser ligeiramente elíptica. Não foram capazes de confirmar estes cenários, mas também não conseguiram excluí-los. É também possível que o período orbital esteja diminuindo, em vez de aumentar, mas apenas observações adicionais dos trânsitos de WASP-103b com o Cheops e outros telescópios vão ajudar a esclarecer este mistério.

Um artigo foi publicado no periódico Astronomy & Astrophysics.

Fonte: Observatoire de Paris

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